Regime especial de tributação, condomínios industriais e zonas de processamento de exportação em regiões afetadas por desastres ambientais

Resumo: O artigo demonstra a possibilidade e viabilidade jurídica e econômica para utilização de regime especial de tributação com vistas à recuperação de regiões impactadas por desastres ambientais. Nesse sentido, além de analisar a legislação tributária relacionada, traz axiomas e argumentos que corroboram para a viabilidade da instituição de regimes especiais em contextos que justifiquem a necessidade de apoio estatal à recuperação econômica de regiões afetadas. Ademais, o estudo ainda aponta a possibilidade de implementação de condomínios industriais e de Zonas de Processamento de Exportação (ZPE) em tais regiões.

Palavras-chave: Tributação; Regime Especial; Condomínios Industriais; ZPEs; Desastres Ambientais.

Abstract: The article demonstrates the possibility and legal and economic feasibility for the use of special arrangements for taxation with a view to recovery of regions affected by environmental disasters. Thus, in addition to analyzing the related tax law, brings axioms and arguments which will corroborate the special schemes institution viability in Contexts That justify a need for state support to economic recovery regions affected. Moreover, study still points to the possibility of implementation of industrial condominiums and Export Processing Zones (ZPE) in such regions.

Keywords: Taxation; Special Regime; Industrial Condos; ZPEs; Environmental disasters.

Sumário: 1. Introdução; 2. Do Regime Especial de Tributação em Minas Gerais; 3. Recuperação Econômica mediante Condomínios Industriais e Zonas de Processamento de Exportação; Conclusão; Referências Bibliográficas.

1. INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CR/88) cuida do Sistema Tributário Nacional dos artigos 145 a 162, consubstanciando em seu art. 1º os princípios fundamentais que visam defender a dignidade da pessoa humana, a manutenção da soberania brasileira e a cidadania.

Oliveira (1991, p. 17) assevera que o tributo constitui “uma das mais poderosas ferramentas colocadas à disposição das autoridades governamentais para impulsionarem, orientarem e conduzirem o desenvolvimento de determinado país”. Rawls (2000, p. 306) acrescenta que não somente para custear as atividades estatais, o tributo deverá atender a fins de corrigir desigualdades de concentração de renda com vistas a propiciar “valor equitativo da liberdade política e igualdade equitativa de oportunidades”.

Os princípios que orientam o Estado Democrático de Direito brasileiro devem estar alinhados aos valores trazidos pela Carta Magna. Por esta razão, Baleeiro (1998) ensina que a finalidade do tributo não é tão rígida, podendo adaptar-se aos anseios políticos:

“O tributo é vetusta e fiel sombra do poder político há mais de 20 séculos. Onde se ergue um governante, ela se projeta sobre o solo de sua dominação. (…) No curso do tempo, o imposto, atributo do Estado, que dele não pode prescindir sequer nos regimes comunistas de nosso tempo, aperfeiçoa-se do ponto de vista moral, adapta-se às cambiantes formas políticas, reflete-se sobre a economia ou sobre os reflexos desta, filtra-se em princípios ou regras jurídicas e utiliza diferentes técnicas para execução prática.” (BALEEIRO, 1998, p. 1).

Alinhando-se os axiomas constitucionais aos preconizados por John Rawls (2000) e Amartya Sen (2014), tem-se que a justiça deve ser perseguida acima do critério da eficiência. O princípio da eficiência é chamado por Rawls (2000) de princípio do “Ótimo de Pareto”, segundo o qual uma configuração é eficiente sempre que é impossível mudá-la de modo a fazer com que uma pessoa melhore a sua situação sem que, ao mesmo tempo, outra pessoa piore a sua.

Geralmente aplicada na economia, tal teoria admite que ser eficiente não significa ser necessariamente justo. Todavia, segundo Rawls (2000) e Sen (2014), a justiça deve tratar os menos favorecidos da sociedade de maneira diferenciada e estruturar o Estado para que o conjunto das normas e instituições permitam o desenvolvimento pessoal e a efetivação das liberdades.

Por esta razão, as estruturas definidas pela legislação tributária brasileira devem considerar critérios de justiça tributária não apenas sob a perspectiva da equidade e da seletividade, mas inclusive das desigualdades territoriais, ainda mais em se considerando um país de tamanha extensão territorial como é o Brasil.

O Código Tributário Nacional (CTN), Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966, institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios.

Como requisitos necessários para uma estrutura tributária adequada, Musgrave e Musgrave (1980, p. 178) apontam que:

“• A distribuição do gravame tributário deve ser eqüitativa;

 • As imposições de “excesso de gravame” devem ser minimizadas;

 • A estrutura tributária deve favorecer a utilização da política tributária com relação aos objetivos de estabilização e crescimento;

 • O sistema tributário deve permitir uma administração eficiente e isenta de arbitrariedades; e

 • Os custos administrativos e de atendimento às exigências tributárias devem ser tão baixos quanto for compatível com os outros objetivos.”

O sistema tributário nacional possui o poder de afetar a disponibilidade de renda que as pessoas poderão gozar após a tributação. Por essa razão, afeta as escolhas possíveis dos cidadãos brasileiros. Acerca da importância de se pensar nos cidadão, pode-se citar que:

“Os Estados Unidos também são muito mais ricos hoje do que o México ou o Peru graças ao modo como as suas instituições, tanto econômicas quanto políticas, geram incentivos para empresas, indivíduos e políticos. Cada sociedade funciona com um conjunto de regras econômicas e políticas criadas e aplicadas pelo Estado e pelos cidadãos em conjunto. As instituições econômicas dão forma aos incentivos econômicos: incentivos para buscar mais educação, para poupar e investir, para inovar e adotar novas tecnologias, e assim por diante. É o processo político que determina a que instituições econômicas as pessoas viverão submetidas, e são as instituições políticas que ditam como funciona esse processo.” (ACEMOGLU, ROBINSON, p. 32)

Destarte, as instituições influenciam o comportamento e criam uma rede de incentivos que irão delimitar o sucesso ou o fracasso dos países.

Recorrendo a Mankiw (2009), cabe apontar que o efeito da tributação atua diretamente na economia, impactando de forma inversamente proporcional o tamanho do mercado, que tende a reduzir e ficar abaixo do ideal com elevação da tributação, consequentemente deixando o mercado menos eficiente e impedindo ganhos sistêmicos para toda região:

“O imposto é um peso morto porque induz compradores e vendedores a uma mudança de comportamento. O imposto eleva o preço pago pelos compradores de modo que eles consomem menos. Ao mesmo tempo, reduz o preço recebido pelos vendedores, assim eles passam a produzir menos. Por causa dessas mudanças de comportamento, o tamanho do mercado diminui e fica abaixo do ideal. As elasticidades da oferta e da demanda medem o quanto vendedores e compradores respondem às variações no preço e, portanto, determinam quanto um imposto distorce o resultado de mercado. Assim, quanto maiores as elasticidades de oferta e demanda, maior o peso morto de um imposto.” (MANKIW, 2009, p. 166) (grifos nossos).

Considerando o ocorrido no Município de Mariana, em Minas Gerais, em 05 de novembro de 2015, quando do rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco e consequentemente impactos catastróficos não somente do ponto de vista do ambiente físico, mas socioeconômicos, culturais e humanos (IBAMA, 2015), o presente trabalho pretende demonstrar a possibilidade e a viabilidade da instituição de regime especial de tributação com vistas a fomentar a recuperação econômica de regiões impactadas por grandes desastres como o ocorrido.

Para tanto, o artigo aborda aspectos relacionados a regimes especiais de tributação através da revisão de literatura, bem como se valendo da legislação infraconstitucional, e em especial da legislação do Estado de Minas Gerais, busca construir arcabouço jurídico que corrobore a possibilidade de instituição de regime diferenciado em âmbito estadual.

O estudo ainda traz a experiência da política fluminense de recuperação econômica de áreas ambientalmente degradadas mediante a implantação de condomínios industriais e os principais aspectos relacionados à implementação de zonas de processamento de exportações.

2. DO REGIME ESPECIAL DE TRIBUTAÇÃO EM MINAS GERAIS

A CR/88 preconiza a autonomia de seus entes federados ao estabelecer em seu artigo 1º que “a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal”.

De acordo com Reis (2010), a autonomia dos entes federados cumpre o papel de resguardar a unidade da ordem jurídica total do Estado Federal, garantindo um sistema jurídico único e um sistema político integrado e integral. Ao passo que Baracho (1982) denomina Federalismo Fiscal a forma como os entes federados se organizam em relação às decisões e ao controle de seus recursos financeiros.

Dessa feita, Reis (2010) assevera que para cada ente federado a Constituição Federal de 1988 atribuiu a possibilidade privativa de tributar determinado fato ou ato gerador de riqueza, sem ingerência de outro ente.

Acerca da autonomia dos Estados-federados brasileiros, Coêlho (2009, p. 63) acrescenta que:

"A característica fundamental do federalismo é a autonomia do Estado-Membro, que pode ser mais ou menos ampla, dependendo do país de que se esteja a cuidar (…). Sendo a federação um pacto de igualdade entre as pessoas políticas, e sendo a autonomia financeira o penhor da autonomia dos entes federados, tem-se que qualquer agressão, ainda que velada, a estes dogmas, constitui inconstitucionalidade". 

Grosso modo, a priori, não existe óbice jurídico à concessão de benefícios regionais, tendo em vista a legitimidade do fomento público em região assolada por grandes desastres. Nesse fim, a Constituição do Estado de Minas Gerais, em seu art.152 dispõe que:

Art. 152 – É vedado ao Estado, sem prejuízo das garantias asseguradas ao contribuinte e do disposto no art. 150 da Constituição da República e na legislação complementar específica:

I – instituir tributo que não seja uniforme em todo o território estadual, ou que implique distinção ou preferência em relação a Município em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivo fiscal destinado a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do Estado”; (grifos nossos).

Em atenção a esse desiderato, o Estado de Minas Gerais, no ano de 2011, alterou a Lei nº 6.763/75, que consolida a legislação tributária no Estado de Minas Gerais, para introduzir beneficio fiscal a municípios mineiros compreendidos pela área de atuação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), a saber:

“Art. 32-A – Fica o Poder Executivo autorizado a conceder crédito presumido do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS -, na forma, no prazo e nas condições previstos em regulamento:(…)

IX – por meio de regime especial, ao estabelecimento signatário de protocolo firmado com o Estado, de modo que a carga tributária, nas operações de saída por ele promovidas, resulte em, no mínimo, 3% (três por cento);(…)

Parágrafo único. Na hipótese do inciso IX do caput, a concessão do crédito presumido, por meio de regime especial, poderá resultar em carga tributária inferior a 3% (três por cento) caso o estabelecimento signatário de protocolo firmado com o Estado esteja localizado em Município compreendido na área de atuação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – Sudene.” (grifos nossos).

Verifica-se in casu a adoção de critério regional para a disponibilização de incentivos fiscais para municípios localizados na área da SUDENE.

De mesma sorte, pode-se apontar as legislações dos estados do Rio de Janeiro e do Maranhão. Assim, a lei maranhense n.º 10.349, de 20 de outubro de 2015, criou o Programa Especial de Desenvolvimento para municípios maranhenses que façam parte de Rede Integrada de Desenvolvimento (RIDE). Ao passo que a lei fluminense n.º 6.979, de 31 de março de 2015, instituiu tratamento tributário especial de caráter regional aplicado a estabelecimentos industriais.

Há de se reforçar que concessões de benefícios a determinados setores ou segmentos da economia, seja com isenções ou seletividade de alíquotas de determinados tributos, não guardam relação às justificativas de caráter espacial aqui abordadas, potencialmente ocasionando por diversos momentos, inclusive, a denominada “guerra fiscal”.

Como mecanismo de harmonização dos diversos interesses estaduais, a Constituição da República Federativa do Brasil estipula, em seu art.155, §2º, inciso XII, alínea “g” que os benefícios fiscais concedidos no âmbito do ICMS devem ser outorgados mediante deliberação dos estados e Distrito Federal, consoante lei complementar. Tal norma é a Lei Complementar nº 24, de 07 de janeiro de 1975, que concretiza a forma de realização das decisões conjuntas através do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ):

“Art. 1º – As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta lei.

Parágrafo único – O disposto neste artigo também se aplica:

I – à redução da base de cálculo;

II – à devolução total ou parcial, direta ou indireta, condicionada ou não, do tributo, ao contribuinte, a responsável ou a terceiros;

III – à concessão de créditos presumidos;

IV – à quaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiro-fiscais, concedidos com base no Imposto de Circulação de Mercadorias, dos quais resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus;

V – às prorrogações e às extensões das isenções vigentes nesta data.

Art. 2º – Os convênios a que alude o art. 1º, serão celebrados em reuniões para as quais tenham sido convocados representantes de todos os Estados e do Distrito Federal, sob a presidência de representantes do Governo federal.

§ 1º – As reuniões se realizarão com a presença de representantes da maioria das Unidades da Federação.

§ 2º – A concessão de benefícios dependerá sempre de decisão unânime dos Estados representados; a sua revogação total ou parcial dependerá de aprovação de quatro quintos, pelo menos, dos representantes presentes.

§ 3º – Dentro de 10 (dez) dias, contados da data final da reunião a que se refere este artigo, a resolução nela adotada será publicada no Diário Oficial da União.”

Tal normatização busca, basicamente, evitar a concessão abusiva de benefícios fiscais pelos entes federados na competição para atrair investimentos privados. Como se sabe, a despeito desta regulamentação, os estados vem concedendo, de forma unilateral, diversas vantagens fiscais no intento de atrair investimentos privados. A respeito, tem-se a seguinte decisão do STF referente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.º 4.481:

“I. TRIBUTÁRIO. LEI ESTADUAL QUE INSTITUI
BENEFÍCIOS FISCAIS RELATIVOS AO ICMS. AUSÊNCIA DE CONVENIO INTERESTADUAL PRÉVIO. OFENSA AO ART. 155, § 2o, XII, g, DA CF/88. II. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. MODULAÇÃO DOS EFEITOS TEMPORAIS. 1. A instituição de benefícios fiscais relativos ao ICMS só pode ser realizada com base em convênio interestadual, na forma do art. 155, §2º, XII, g, da CF/88 e da Lei Complementar no 24/75. 2. De acordo com a jurisprudência do STF, o mero diferimento do pagamento de débitos relativos ao ICMS, sem a concessão de qualquer redução do valor devido, não configura benefício fiscal, de modo que pode ser estabelecido sem convênio prévio. 3. A modulação dos efeitos temporais da decisão que declara a inconstitucionalidade decorre da ponderação entre a disposição constitucional tida por violada e os princípios da boa-fé e da segurança jurídica, uma vez que a norma vigorou por oito anos sem que fosse suspensa pelo STF. A supremacia da Constituição e um pressuposto do sistema de controle de constitucionalidade, sendo insuscetível de ponderação por impossibilidade lógica. 4. Procedência parcial do pedido. Modulação para que a decisão produza efeitos a contatar da data da sessão de julgamento”. (ADI 4.481 – Rel. Min. Luís Roberto Barroso. Data do julgamento: 11/03/2015.)

Cabe frisar que a não aprovação dos incentivos fiscais pelo CONFAZ, nos moldes estipulados no art.155, §2º, inciso XII, alínea “g” da Constituição Federal, tem levado estados destinatários dos produtos contemplados com benefício advindo de outro ente federado a “glosarem” os créditos do ICMS, tornando ineficaz o ato concessivo na origem. Tal circunstância tem trazido instabilidade econômica e insegurança jurídica às empresas.

Ao mesmo tempo, o Estado de Minas Gerais, como mecanismo de autotutela da concessão unilateral e abusiva de benefícios fiscais por outros entes da federação, se vale de contramedida através do qual lança mão de incentivos unilaterais, tendo em vista o equilíbrio da competição por investimentos privados. Tal inteligência pode ser demonstrada no dispositivo abaixo, extraído da Lei 6.763/75:

“Art. 32-K. Fica o Poder Executivo autorizado a conceder crédito presumido do ICMS de até 100% (cem por cento) do imposto devido nas operações de saída, desde que a medida adotada seja adequada, necessária e proporcional para assegurar a isonomia tributária, igualdade competitiva e livre concorrência, enquanto perdurarem os efeitos decorrentes da presunção de constitucionalidade de ato normativo de outra unidade da Federação que conceda benefício ou incentivo fiscal ou financeiro-fiscal não previsto em lei complementar ou convênio celebrado nos termos da legislação específica”.

O supracitado normativo é um dos autorizativos para a concessão de benefícios fiscais unilaterais no estado de Minas Gerais. Contudo, tal dispositivo vem sendo contestado no STF por meio da ADI 5.151, proposta pelo governador do Estado de São Paulo, sendo que atualmente se encontra suspenso cautelarmente.

Ainda em Minas Gerais, a Lei nº 15.980, de 13 de janeiro de 2006, criou o Fundo de Equalização do Estado de Minas Gerais com o objetivo de aumentar a competitividade do Estado para atrair e manter empresas que apresentem ou desenvolvam empreendimentos de importância estratégica para a expansão ou modernização das cadeias produtivas ou de suas aglomerações produtivas locais, através da concessão de financiamentos.

Já a Lei Estadual nº 19.822, de 22 de novembro de 2011, acrescentou ao rol dos permissivos para percepção dos referidos incentivos a localização de empreendimentos nos municípios compreendidos na área de atuação da SUDENE, restando certa a compatibilidade do mecanismo com o critério espacial de incentivo.

Diante de tal circunstância, verifica-se que inexiste óbice à inclusão no mesmo rol, ainda que de forma transitória, de empreendimentos localizados em área afetada por desastre como o ocorrido na região de Mariana.

Outrossim, conforme o art. 6º, §1º da Lei nº 15.981, de 16 de janeiro de 2006, alterada pela suscitada Lei nº 19.822, de 22 de janeiro de 2011, o Fundo de Incentivo ao Desenvolvimento (FINDES) também traz tratamento especial às áreas compreendidas no âmbito de atuação do SUDENE.

3. RECUPERAÇÃO ECONÔMICA MEDIANTE CONDOMÍNIOS INDUSTRIAIS E ZONAS DE PROCESSAMENTO DE EXPORTAÇÃO

Objetivando a recuperação econômica de regiões afetadas por grandes desastres ambientais, outra medida possível seria a implementação de distritos industriais, mediante incentivos fiscais visando à atração de indústrias e consequente desenvolvimento econômico.

Essa iniciativa pode ser vislumbrada tendo por parâmetro o projeto de lei estadual 3.216/2010 do Estado do Rio de Janeiro, que dispõe sobre a Política de Recuperação Econômica de Áreas Socialmente Degradadas mediante a Implantação de Condomínios Empresariais. Assim sendo, mediante convênio ratificado pelo CONFAZ, surgiria uma política que, abstratamente, permitiria a qualquer Estado-membro da Federação conceder benefícios fiscais transitórios a estabelecimentos que vierem a se instalar em condomínios industriais em áreas atingidas por tragédias socioambientais.

De acordo com Machado et al. (1997), os condomínios industriais e de serviços parecem representar solução viável com vistas à evitar a evasão de recursos produtivos de determinado ente federativo. Apenas alertam que “a viabilidade da implantação do condomínio deve ser assegurada por um equilíbrio entre os custos de implantação e operação e os benefícios advindos de sua comercialização” (p. 4).

Os autores ainda apontam que:

“(…) os condomínios podem ser instalados em áreas de grandes empresas com capacidade ociosa, em imóveis públicos, ou mesmo em áreas incorporadas por empreendedores privados que queiram dar um novo uso aos imóveis existentes.” (MACHADO et al., 1997, p. 2).

Outra possibilidade seria a Zona de Processamento de Exportação (ZPE), que compreende um mecanismo de incentivo econômico com caráter regional e é regulada pela Lei 11.508, de 20 de julho de 2007, a qual determina em seu art. 1º que:

“Art. 1º É o Poder Executivo autorizado a criar, nas regiões menos desenvolvidas, Zonas de Processamento de Exportação (ZPE), sujeitas ao regime jurídico instituído por esta Lei, com a finalidade de reduzir desequilíbrios regionais, bem como fortalecer o balanço de pagamentos e promover a difusão tecnológica e o desenvolvimento econômico e social do País.”

Deve abstrair o conceito da ZPE do parágrafo único do referido normativo:

“Parágrafo único. As ZPE caracterizam-se como áreas de livre comércio com o exterior, destinadas à instalação de empresas voltadas para a produção de bens a serem comercializados no exterior, sendo consideradas zonas primárias para efeito de controle aduaneiro.”

Silva et al. (2014) defendem que para promover o desenvolvimento econômico e social do país, as ZPEs objetivam atrair investimentos, gerar empregos, agregar valor à produção nacional, além de aumentar as exportações.

Lins e Amorim apud Silva et al. (2014, p. 2), ensinam que “a criação e implantação das ZPEs foi estratégico e ocorreu em macrorregiões nacionais, seja por conta das potencialidades seja pelas necessidades históricas e estruturais”.

A Associação Brasileira de Zonas de Processamento de Exportação (ABRAZPE) considera as ZPEs como distritos industriais incentivados:

“As empresas neles localizadas operam com suspensão de impostos, liberdade cambial (podem manter no exterior, permanentemente, as divisas obtidas nas exportações) e procedimentos administrativos simplificados – com a condição de destinarem pelo menos 80% de sua produção ao mercado externo.” (SILVA et al., 2014, p. 4).

Considerando o desastre ambiental decorrente do rompimento da barragem de rejeitos de minério de ferro da Samarco, em novembro de 2015 em Minas Gerais, interessante resgatar que o convênio ICMS n.º 88, de 15 de agosto de 2014, incluiu o Estado de Minas Gerais no escopo de aplicação do convênio ICMS n.º 99, de 25 de setembro de 1998, ambos do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ).

Ocorre que o convênio ICMS n.º 99/98 autoriza unidades federadas a conceder isenção de ICMS nas saídas internas destinadas aos estabelecimentos localizados em ZPE:

"Cláusula primeira Ficam os Estados do Acre, Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins e o Distrito Federal autorizados a isentar do ICMS as saídas internas de produtos previstos na Lei nº 11.508, de 20 de julho de 2007, ou outro diploma que venha a substituí-la, com destino a estabelecimento localizado em Zona de Processamento de Exportação – ZPE."

De acordo com o art. 2º da Lei 11.508/2007, a implementação das ZPE se dá por meio de decreto presidencial, após proposta do Estado ou municípios, obedecidos parâmetros técnicos fixados na legislação. Destarte mostra-se necessária a elaboração de estudos tendentes à implementação de ZPE em áreas afetadas por desastres ambientais sempre que ocorrerem.

CONCLUSÃO

Considerando a possibilidade de ocorrência de futuros desastres ambientais relacionados a grandes empreendimentos econômicos no Brasil, como o ocorrido no Município de Mariana em 2015, este estudo demonstrou a viabilidade de instituição de regime especial de tributação de caráter espacial às áreas afetadas.

Tal instituto, geralmente utilizado para promover a redução de históricas desigualdades regionais no país, não encontra óbice a sua utilização para recuperar a economia de regiões abaladas por grandes desastres. Podendo, inclusive, acarretar diversificação da base econômica local e, consequentemente, evitar futuros desastres relacionados àquela atividade histórica.

Não obstante, analisando a legislação do Estado de Minas Gerais, restou demonstrada a viabilidade de utilização do Fundo de Equalização e do Fundo de Incentivo ao Desenvolvimento para revitalização da região de Mariana, mediante elaboração de projeto de lei que inclua a localidade no rol de hipóteses do art. 6º, inciso III, §1º da Lei Estadual nº 15.981/06.

Ademais, ainda revela-se de extrema relevância o desenvolvimento de políticas de recuperação econômica de áreas ambientalmente degradadas com incentivo a implantação de condomínios industriais, beneficiados com incentivos fiscais, além da criação de zona de processamento de exportação nessas regiões.

Acerca da possibilidade de utilização de condomínios industriais e zonas de processamento de exportação, decerto que se mostraria necessária força política e apelo social para aprovação pelo CONFAZ, sendo certo que tal órgão possui aptidão para disponibilizar a medida a qualquer ente estadual, através da edição de decreto legislativo pelas Assembleias Legislativas.

Acredita-se que iniciativas como a uma política econômica para recuperação econômica através de condomínios industriais ou instituição de zonas de processamento de exportação possuiriam o condão de amenizar os impactos econômicos trazidos por grandes catástrofes ambientais, que afetam, inclusive, as populações historicamente mais vulnerabilizadas.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Paulo Sérgio Mendes César

Doutorando em Ciência Política pela UFMG mestre em Administração Pública pela Fundação João Pinheiro especializado em Direito Público pela UCDB Graduado em Direito pela UFMG e em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro. Professor universitário advogado e servidor público estadual na carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental na Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais


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