Seres políticos e a (in) constitucionalidade do Decreto Presidencial nº 8.243/2014

Resumo: Os Decretos Presidenciais são normas infraconstitucionais e como tal devem estar em consonância com a Constituição da República Federativa do Brasil. No entanto, diante da publicação do Decreto 8.243/2014, um decreto presidencial, iniciou-se diversas discussões sobre sua constitucionalidade. Existem juristas que defendem tanto a inconstitucionalidade, como sua constitucionalidade, diante do atual modelo de democracia exercido no país e aquele pensado pela Constituição vigente. Porém, percebe-se que a discussão é prévia, uma vez que é necessário inicialmente preparar o povo brasileiro para uma democracia participativa, objetivo indireto do Decreto estudado.[1]

Palavras chaves: decreto presidencial; seres políticos; democracia; inconstitucionalidade; participação social.

Abstract: The Presidential Decrees are infra-constitutional norms and as such should be in line with the Constitution of the Federative Republic of Brazil. However, before the publication of Decree 8,243 / 2014, a presidential decree, several began discussions on its constitutionality. There are lawyers who defend both the unconstitutionality, as its constitutionality before the current model of democracy exercised in the country and he thought the current Constitution. However, it is clear that the discussion is preliminary, since it is first necessary to prepare the Brazilian people for participatory democracy, indirect objective of the study Decree.

Key words: presidential decree; political beings; democracy; unconstitutionality; social participaton.

Sumário: Introdução. 1. Decreto e sua definições. 2.Inconstitucionalidade de um Decreto. 3.Seres Políticos e a Democracia. 4. Evolução da Democracia no Brasil. 5. O Decreto Presidencial 8.243/2014. 6. Constitucionalidade X Inconstitucionalidade. 6.1 Inconstitucionalidade. 6.2 Constitucionalidade. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

Quando ocorrem alterações políticas no Brasil a maioria dos cidadãos são os últimos a se interarem sobre as mudanças, isto porque a democracia que mais prevalece no Brasil é a representativa, fazendo com que a população se sinta confortável em abdicar de uma maior participação política, social, jurídica e econômica do país.

No entanto a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) prevê uma democracia mais evoluída, a participativa. Tendo como justificativa esse parâmetro da CRFB a presidente Dilma Rousseff, em 2014 sancionou o Decreto Presidencial 8.243 que instituiu a Política e o Sistema Nacional de Participação Social.

Este Decreto gerou inúmeras discussões acerca da sua (in) constitucionalidade, os juristas e os jornalistas foram muito críticos nessas questões chegando a ocorrer uma disseminação de que o objetivo do Decreto seria um possível golpe de Estado.

Porém nota-se que o intuito do Decreto, mesmo que indiretamente, é incentivar uma população mais ativa na sociedade, respeitando os limites apresentados na Constituição da República Federativa do Brasil e, portanto, incentivar a participação popular nas discussões políticas do país.

No entanto, a dúvida persiste sobre as discussões sobre a Constitucionalidade do Decreto, uma vez que, Decretos Presidenciais, como atos políticos do presidente em exercício, devem, como todas as leis, serem submetidos à Constituição Federal vigente e, como tal, estarem em concordância com os seus mandamentos, isto é, estarem consoantes com a Constituição Federal.

O que se percebe é uma gama de políticos, jornalistas e juristas divergindo diante da constitucionalidade formal e material do Decreto sancionado. O que não se percebe, no entanto, é a participação do restante da população diante de tamanha controvérsia. Percebe-se, com isso, que mais uma vez o povo abdica de sua participação diante de um assunto que interfere diretamente na sua cidadania.

Para isso, é necessário que a população brasileira se der conta que democracia e exercício de cidadania não se confundem e por isso vão mais além do que votar. É ter a percepção das consequências desse voto e saber os frutos positivos e negativos decorrentes desse meio democrático. Para assim, o cidadão brasileiro, de fato ser considerado um ser político, e, consequentemente capaz de se posicionar diante das decisões tomadas nas casas dos Congressos e na Presidência da República que afetam toda a nação.

1. DECRETOS E SUAS DEFINIÇÕES

Partindo da etimologia da palavra, Decreto, deriva do latim e quer dizer decisão, determinação. Segundo De Plácido e Silva (2010, p.240): decreto "revela toda decisão ou resolução, tomada por uma pessoa ou por uma instituição, a que se conferem poderes especiais e próprios para decidir ou julgar, resolver ou determinar". Isto é, estes servem para autoridades imporem suas deliberações.

Continuando a definição de Decreto, De Plácido e Silva determina que este pode subdividir-se em Judiciário, Legislativo e Decreto-Lei.

Decreto-Judiciário é aquele que tem que ser cumprido pelas partes interessadas e é dada por uma autoridade judicial (ex. sentença de um juiz). Decreto Legislativo, não constitui direito novo, porém "Compreende as deliberações, em que se consagra uma medida qualquer de caráter administrativo ou político do Congresso Nacional." (De Plácido e Silva 2010, p.240). E por fim o Decreto-Lei que foi abolido pela Constituição Federal, era um ato do Poder Executivo e se equiparava as próprias leis.

No entanto, Decretos, sobe à luz da redação original da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), são atos administrativos formais, isto é, criados com a intenção de serem simples manifestações do poder regulamentar e de esclarecerem o conteúdo de leis prévias – não poderiam aumentar nem diminuir a interpretação e alcance das mesmas.

Com a Emenda Constitucional nº 32, que modifica a redação do art. 84, VI, CRFB de 1988, in verbs:

“Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

VI – dispor, mediante decreto, sobre:

a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;

b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos;”

 Os decretos passam a ser de competência privativa do Presidente da República e podem versar unicamente sobre a organização administrativa do Poder Executivo Federal. Surge, portanto, a figura do Decreto Autônomo, aquele que não é vinculado à lei pré-existente. A Constituição, mais uma vez, é clara ao determinar quando este decreto pode ser usado.

Persiste a dúvida sobre o motivo das discussões acerca da inconstitucionalidade do ato sancionado pelo presidente em exercício, dado que a própria Constituição limita sua aplicabilidade.

Diversas figuras políticas e estudiosos do direito veem neste Decreto uma forma de afetar a competência do poder do Congresso. O que essas figuras políticas discutem não é unicamente a “perda” do poder pelo congresso, mas também a forma como esta foi feita. Como o decreto é visto como uma interferência no poder legislativo, para eles essa medida deveria ter sido feita na forma de projeto de lei para que os parlamentares participassem da discussão.

Estudos sobre o assunto chegaram a apontar que o decreto seria um meio para um golpe de Estado, "uma mera fachada de um regime autoritário, ou, nas palavras dos críticos mais duros, de um "regime bolivarianista" inspirado nos modelos políticos de Venezuela e Cuba" (CUNHA FILHO E GUIMARÃES FILHO, 2015, p 3).

Outro grupo de estudiosos interpreta esse Decreto como mera interpretação de artigos da Constituição que permite uma maior participação popular. Por isso, surge a necessidade de analisar o Decreto para constatar a sua constitucionalidade ou não, valendo-se dos princípios de democracia e da Constituição da República Federativa do Brasil.

2. INCONSTITUCIONALIDADE DE UM DECRETO.

Inicialmente vale destacar que inconstitucionalidade é o que se opõe "a preceito, regra ou princípio instituído na Constituição (…) [e] é revelada por disposição de norma ou ato emanado de autoridade pública que se mostrem contrários ou infringentes de regra fundamental da Constituição". (DE PLÁCIDO E SILVA, 2010, p. 427)

Considerando o que é inconstitucionalidade, a doutrina divide em dois tipos: Formal e Material. Isto é importante para compreensão da amplitude da inconstitucionalidade apontada por alguns.

 Nas questões abordadas pelos defensores da inconstitucionalidade do Decreto estudado, foram apresentadas tanto a material quanto a formal, pois, além de afetar o texto constitucional – interferindo no poder legislativo (inconstitucionalidade material), o conteúdo não poderia ser apresentado em forma de decreto (inconstitucionalidade formal).

Conforme define De Plácido e Silva (2010, p. 368) constitucionalidade formal é quando seus atos estão de acordo com as prescrições legais, ou seja, o ato só existirá de fato se seguir o modelo determinado quando assim exigido. Sendo assim, "Se é formal, tem que se calcar ou se modular na forma indicada ou preconizada por lei. Neste caso, não sendo livre a forma, somente a coisa terá existência seguindo as solenidades em que se modula.".

Em relação à constitucionalidade material a análise é referente ao conteúdo. Verifica-se se a norma derivada está em consonância com a matéria prima da norma primária. Isto é, o núcleo da norma infraconstitucional não pode está em desacordo com os regramentos e princípios constitucionais, uma vez que estes são as matérias primas do ordenamento jurídico. Com isso, percebe-se que uma norma só tem existência se ela corroborar com o núcleo das normas constitucionais. 

Isso corrobora o entendimento de muitos dos estudiosos a respeito da interferência na competência do Congresso. Porém, quem elege o Congresso, responsável pela representação popular, é o cidadão através do voto. Ele é quem deveria ter maior interesse em todos os debates que abrangem a Participação Popular, no entanto, é o que menos se vê na sociedade. Daí vem à importância da população tornar-se, de fato, cidadãos.

Ser um ser político não significa que este precise militar em campanhas eleitorais, mas sim, que tenha senso crítico, que saibam das decisões que seus representantes tomem em seu nome, compreendendo por fim que o voto é uma parcela mínima da democracia.

3. SERES POLÍTICOS E A DEMOCRACIA

O regime político regente no Brasil é o da Democracia. A palavra democracia vem do grego e remetendo-se a sua etimologia a definição que se obtém é poder do povo. O modelo de Democracia que é utilizado como base é o ateniense (sec. IV e III a.C), onde aqueles considerados cidadãos (homens maiores de 21 anos)  participavam diretamente dos assuntos da cidade. Nesse tempo a democracia não era vista como liberdade individual e sim como pessoas integrantes de uma sociedade.

No entanto, na contemporaneidade a democracia é vista como a participação efetiva de uma coletividade, principalmente através do voto, onde os escolhidos são legitimados para decidir em nome da coletividade, às vezes com a necessária interferência destes.

Para resumir toda a evolução da democracia afirmam doutrinadores que antigamente a democracia era unicamente direta, ou seja, meramente representativa; com a evolução dos tempos, atualmente entende-se democracia como participação ativa. Isto é, apesar de antigamente o sistema ser representativo era sem a interferência da população. Atualmente, o sistema é representativo, porém com a interferência do povo.

Dahl (2001), acredita que a sociedade brasileira seja poliárquica, já que o Brasil é um Estado extenso e populoso, onde o poder emana do povo, sendo assim um governo de muitos. Para este autor, existem condições essenciais e favoráveis para este “novo” regime. Apresentadas por Corralo (2015, p. 290) da seguinte forma:

“controle civil das forças militares, por pessoas eleitas; cultura política e convicções democráticas; inexistência de controle estrangeiro contrário ao regime democrático; economia de mercado; fraco pluralismo subcultura”.

Diante das características apresentadas pelo doutrinador, chega-se a conclusão de que o regime atual é além de representativo, é participativo. Porque apesar de não possuir um fraco pluralismo subcultural (país culturalmente homogêneo) o Brasil possui um governo que não é uma ditadura e o controle civil é feito por pessoas eleitas, a Constituição é bem clara ao determinar a convicção democrática e o país não possui controle estrangeiro de regime político divergente.

A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988, em seu primeiro artigo dispõem sobre a sua formação, in verbs:

“A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;

II- a cidadania;

III – a dignidade da pessoa humana;

IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V – o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”

O legislador ao descrever, no artigo 1º da CRFB a constituição da estrutura política do país, teve como intenção não deixar questionamentos quanto ao regime político regente. Com isso, não resta dúvidas sobre a subordinação de todos os cidadãos, inclusive dos representantes políticos, ao respeito das garantias fundamentais, baseadas no princípio da dignidade da pessoa humana.

Portanto, a Constituição refere-se a quem exercerá o poder de estado, visto que em uma Democracia o Estado necessita de pessoas para tomar decisões pela sociedade, exaltando assim à importância da população, já que “todo o poder emana do povo”. Atestando assim a relevância da participação popular.

A participação popular é a legítima execução do poder político pelo cidadão. Corroborando este entendimento, De Plácido e Silva (2010, p. 157) apresenta a definição de cidadania da seguinte forma:

“Segundo a teoria, que se firma entre nós, a cidadania, palavra que se deriva de cidade, não indica somente a qualidade daquele que habita a cidade, mas, mostrando a efetividade dessa residência, o direito político que lhe é conferido, para que possa participar da vida política do país em que reside”.

Desta forma, cidadão é aquele integrante de uma cidade que exerce o direito político que lhe é inerente, dando efetividade à “residência” na sociedade.

Seguindo ainda com a explicação de participação popular, De Plácido e Silva (2010, p. 272) elucida direitos políticos como faculdade. Isto é, a vontade de cada cidadão em “participar [ou não] da administração pública, direta ou indiretamente”.

No entanto, a população brasileira, exerce este direito de forma limitada. Utilizando apenas do voto, de dois em dois anos, e imediatamente se suprimindo da cooperação da administração pública do país.

Visto que, a Constituição em seu artigo 14, informa todas as formas em que a soberania popular será exercida:

“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

I – plebiscito;

II – referendo;

III – iniciativa popular”.

Isto significa que o voto é muito importante para a democracia, porém não é o único meio de participação do povo e exercício da cidadania e consequente soberania popular.

A democracia mais conhecida e mais comentada é a ateniense, construída sob a "participação popular", porém esta participação era restrita já que os escravos e as mulheres não faziam parte da parcela considerada cidadã adulta e por isso foi excluída dos debates públicos acerca das questões das cidades, das questões econômicas e das questões políticas.

Porém como o princípio da democracia está na soberania popular iniciou-se uma Democracia Indireta com o lema "O Poder Emana do Povo", traduzindo-se, porém unicamente na Democracia Representativa, já que o poder do povo era o voto. O cidadão decidiu transferir sua participação das questões da cidade, questões econômicas e políticas, decidindo que ao votar estava escolhendo pessoas para fazer isso por ele.

Com a evolução Constitucional vem à democratização da democracia e com isso surgi à esperança da Democracia Participativa. Onde os cidadãos começam a participar efetivamente das questões que envolvem a cidade, a economia e a política, vez que legitima o próprio Estado Democrático de Direito apontado pela Constituição da República Federativa do Brasil.

Os fatores apontados influenciaram, também, o legislador a por a expressão “Estado Democrático de Direito” que defini o regime político do país e as diretrizes a serem obedecidas, inspirando além de uma democracia representativa, a participativa. Para isso, toda a Constituição é composta por orientação para a formação de uma população de Seres Políticos.

Seres Políticos são aqueles que exercem sua cidadania, ou seja, aqueles que por terem uma conscientização da relevância da participação popular, exercem seus direitos políticos em sua totalidade, ou em uma maior parcela do que apenas o voto.

Sendo assim, diante de todos os conceitos apresentados por De Plácido e Silva, se desprende que um Ser Político é aquele que participa efetivamente da organização da administração pública e conhece seus representantes e seus feitos durante seu mandato, bem como conjuntamente, ou não, representa os componentes da população visando o melhor interesse para a evolução dos indivíduos integrantes da sociedade. Contemplando assim uma democracia representativa e participativa.

3. EVOLUÇÃO DA DEMOCRACIA NO BRASIL

Segundo Marconi e Lakatos (2011, p. 91): o método histórico é definido da seguinte forma:

“[…] consiste em investigar acontecimentos, processos e instituições do passado para verificar sua influência na sociedade hoje, pois as instituições alcançaram sua forma atual por meio de alterações de suas partes componentes, ao longo do tempo, influenciadas pelo contexto cultural particular de cada época.”

Percebe-se assim a importância de demonstrar um apanhado da evolução histórica dos regimes políticos no Brasil para poder analisar a influência que este tem no Decreto a ser estudado posteriormente e suas repercussões jurídicas e sociais.

Verifica-se que o Brasil iniciou como Colônia de Exploração, onde a metrópole (Portugal) só tinha interesse em explorar os recursos naturais no intuito de enriquecer e levar prosperidade para o país de origem. Isto é, não se tinha preocupação com o povoamento da colônia e o desenvolvimento interno tanto social, como cultural e jurídico. Sendo assim, não existia indícios de democracia ou outro regime de participação popular.

O que existia era um regime de Capitanias Hereditárias onde as relações não obtinham interferência da política (naquela época, unicamente da metrópole) o que proporcionalizava uma dispersão do poder. A primeira noção de regime político colonial surgiu com o sistema de Governadores-Gerais, que vinham nomeados de Portugal e tinham como finalidade organizar o regime colonial e as instituições políticas.

Logo após este período veio o Império do Brasil, com o regime monárquico que marcou a história do país, isto porque o país deixava de ser, teoricamente, dependente da coroa Portuguesa (sua metrópole), já que se encerrava assim o sistema colonial e consequentemente o monopólio da Metrópole. Foi a partir deste momento que surgiu o voto, para escolher representantes do legislativo e do executivo, onde só poderiam votar os cidadãos: homens, maiores de vinte e cinco anos, ou casados, ou integrantes da igreja e com uma renda mínima decretada pelo imperador. Foi a partir dessa estrutura organizacional que surgiu a primeira Constituição do País (1824).

Apesar de ser com a Constituição de 1824 que o Brasil se organizou como país, foi apenas a partir da Constituição de 1891, promulgada, que surgiu, sob o regime representativo, a República Federativa.

“Inspirada no constitucionalismo norte-americano, consagrou um sistema presidencialista de governo, em que o Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, apenas auxiliado pelos seus Ministros de Estado” (CUNHA JUNIOR, Dirley da, 2013, p. 501).

Sendo assim, fica claro que o modelo atual é uma evolução do modelo pensado na Constituição de 1891, o início definitivo da Democracia Representativa no Brasil.

Após está Constituição o País teve mais seis constituições entre promulgadas outorgadas, passou por diversos regimes políticos: Ditadura Militar, Era Vargas, até a República em 1889, e por isso é relativamente atual a democracia participativa, do jeito pensado pela atual Constituição no Brasil.

Depois de diversas revoluções e revoltas, as mulheres e os jovens conquistaram o direito de votar, e hoje o voto é direto e obrigatório para toda a população alfabetizada maiores de dezoito e menores de setenta anos independente de gênero. Uma forma de “obrigar” a população a participar da democracia no país.

Diante das mudanças de regimes políticos no Brasil, Sousa (2015) explica a obrigatoriedade no voto da seguinte forma: “a existência do voto obrigatório chega a ser justificada como uma ação educativa, pelo pouco tempo que os brasileiros voltaram a escolher diretamente os seus representantes políticos.”.

Já que, devido aos diversos regimes políticos e consequentemente as diversas constituições referentes a esses regimes nem todos os componentes da sociedade brasileira eram considerados cidadãos e por isso nem todos detinham o poder de voto. Sem contar que em alguns desses regimes o voto era estritamente vedado, por ser considerado uma liberdade de expressão.

A primeira característica apontada na hora de descrever o regime democrático é o voto, isso porque é a mais utilizada – se não a única – pelos cidadãos brasileiros. Petrin (2015) acredita que:

“Atualmente, o Brasil pode ser considerado um país democrático devido às suas conquistas de liberdade de expressão e de associação, de direito de voto e informação alternativa, de direito dos líderes políticos competirem por apoio, da elegibilidade para cargos públicos e das eleições livres”.

Como se verifica atualmente a democracia vem crescendo cada vez mais, mesmo que a participação popular não acompanhe este crescimento, hoje se vive em um país plurepartidário e estes possuem espaço livre para suas propagandas eleitorais que são seus meios para conquistar o apoio do cidadão brasileiro e assim se elegerem. Isso, porém, só ocorre através do voto diretamente, ou indiretamente – com apoio nas campanhas eleitorais.

Contudo, com a evolução da democracia e da participação popular, mesmo que não no mesmo nível, a democracia participativa como foi pensada na Constituição de 1988 vem ganhando espaço na atual conjuntura da sociedade brasileira.

Como todas as evoluções sofridas no país, diante de tantos governos o Brasil está alcançando um patamar de democracia participativa e representativa descrita na Constituição Federativa da República do Brasil, que surgiu com o intuito da redemocratização do país, visto que, o mesmo saia do regime de ditadura militar.

A Constituição da República Federativa do Brasil é vista como resume Dirley (2013, p. 511): como "a melhor [Constituição] que tivemos na história política do País e, certamente, a melhor que teremos.".

Pode-se notar que a oitava e vigente Constituição do Brasil zela pela democracia participativa e destina-se, como sugere seu preâmbulo a seguridade "dos valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos", dando uma maior ênfase aos direitos fundamentais embasados na Dignidade da Pessoa Humana, aflorando um sentimento de esperança para o povo brasileiro.

Segundo Dirley (2013, p. 511) esse sentimento de esperança, o qual a Constituição de 1988 provoca nos brasileiros suscita "no País um sentimento constitucional jamais visto antes.". O que gera uma maior motivação para participação do processo político nacional. Um exemplo citado pelo referido autor é o impeachment de um presidente da República que foi provocada pela participação popular.

Com o intuito de aflorar novamente esse sentimento de esperança e motivação para uma maior participação na política nacional a presidente da República, no uso de suas atribuições, instituiu o Decreto da Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS).

4. O DECRETO PRESIDENCIAL 8.243/2014

Inicialmente vale destacar que a palavra Nacional, no nome do Decreto, não foi usada sem sentido. Mais uma vez fazendo referência ao art. 1º da CRFB o país está usando de sua Soberania Interna, ou seja, é quando o Estado utiliza de sua supremacia, no território nacional, para sobrepor a vontade do Estado (que deve sempre comungar com as diretrizes constitucionais) sobre as vontades individuais. Ou seja, a presidente utilizando da soberania interna, institui este decreto com o intuito de fortalecer a participação popular e indiretamente à democracia participativa.

Ratificando este entendimento o Decreto em seu art. 1º determina que:

“Fica instituída a Política Nacional de Participação Social – PNPS, com o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil.
Parágrafo único.  Na formulação, na execução, no monitoramento e na avaliação de programas e políticas públicas e no aprimoramento da gestão pública serão considerados os objetivos e as diretrizes da PNPS.”

No art. 2º do Decreto, o legislador propôs conceitos para o melhor entendimento dos dispositivos apresentados e para o esclarecimento da população dos termos utilizados. Porém vale uma ressalva ao conceito trazido no inciso I: “sociedade civil – o cidadão, os coletivos, os movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”.

Este conceito é tão preciso que acaba por ser imensamente abrangente. Considera-se, por tanto, para o decreto, sociedade civil toda e qualquer pessoa física, os coletivos, os movimentos institucionalizados (MST, MPL, sindicatos, etc) e os não institucionalizados (absolutamente qualquer outra coisa).

Como o Decreto não faz distinção dos movimentos populares (aqueles de confronto com o sistema da sociedade) e os movimentos sociais (aqueles que denunciam algo insatisfatório e reivindicam melhorias), os movimentos de “quebra-quebra”, que não respeitam o direito do outro de ir e vir e acabam por destruir o patrimônio público e privado estão agora institucionalizados pelo decreto como parte integrante da sociedade civil por ser uma forma de manifestação da vontade do povo.

Cunha Filho e Guimarães Filho (2015, p 12) afirmam que a ampliação dos espaços de participação popular vem se intensificando devido "A crise de legitimidade [decorrida] da falta de identificação das pessoas com a ideia de governo da maioria." Isto é, com o tempo a população veio tomando consciência que os governantes não tomavam as melhores decisões para o país e por isso era necessário uma intervenção popular. Por isso a partir do ano de 2002 foi perceptível uma maior interferência da população no país através dos movimentos populares.

O ano de 2015 foi marcado por diversas manifestações populares, a favor e contra o governo atual. Alguns desses movimentos levaram ao senado a aprovar a lei antiterrorismo que pode criminalizar as manifestações populares. Isto porque alguns participantes dessas manifestações utilizaram destas para vandalizar o patrimônio. Por isso, abre-se mais uma incógnita diante desse fato: se este movimento é parte integrante da sociedade civil e pode ser considerado um movimento terrorista como ficará a procedência do decreto?

No art. 6º do Decreto, o legislador descrimina os mecanismos de participação social:

“Art. 6º  São instâncias e mecanismos de participação social, sem prejuízo da criação e do reconhecimento de outras formas de diálogo entre administração pública federal e sociedade civil:

I – conselho de políticas públicas;

II – comissão de políticas públicas;

III – conferência nacional;

IV – ouvidoria pública federal;

V – mesa de diálogo;

VI – fórum interconselhos;

VII – audiência pública;

VIII – consulta pública; e

IX – ambiente virtual de participação social.”

O rol do art. 6º do Decreto é uma forma de obrigar a administração pública a criar uma estrutura de participação social com o intuito de consolidar a democracia participativa como método do governo atual.

Vale lembrar, no entanto, que a Constituição da República Federativa do Brasil no seu art. 14, já determinava meios de participação popular e por isso os mecanismos apresentados no Decreto apenas ampliam o rol do exercício da soberania popular.

“A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos e, nos termos da lei,mediante:

I – plebiscito;

II – referendo;

III – iniciativa popular. […]”

Ao analisar o artigo supracitado nota-se que este faz referência a soberania popular, a democracia representativa e a democracia participativa. Dando o embasamento Constitucional ao objetivo do Decreto. Já que o Decreto incentiva, talvez obriga, a promoção de consulta popular para a validação de atos da administração pública, inclusive de serviços e agências.

Os demais artigos do Decreto apontam diretrizes a serem observadas na hora da composição e convocação para a participação da sociedade civil nos atos normativos. Atos esses que podem ser comissões públicas, conferências nacionais, mesas de diálogos, fóruns internacionais, audiências públicas, mesas de monitoramentos das demandas sociais ou, até mesmo, ambientes virtuais. Todos descritos nos decretos com suas regras impossibilitando – da melhor forma – que haja benefício por parte dos conselheiros deliberativos.

Outro ponto importante, é que todos os atos normativos propostos pelo decreto tem uma forma de ser regido para que os participantes tomem conhecimento prévio de suas etapas, possam participar destas e tomem conhecimento de suas resoluções. Tudo para que seja o mais transparente possível.

Contudo, após a publicação do referido Decreto – chamado por muitos de Decreto das Participações – muitos juristas e doutrinadores atacaram a constitucionalidade do mesmo, alguns ainda foram mais longe afirmando ser a criação de um Poder Paralelo.

5. CONSTITUCIONALIDADE X INCONSTITUCIONALIDADE

Como já demonstrando anteriormente, constitucionalidade é quando o disposto está em concordância tanto formalmente como materialmente com a Carta Magna, Constituição Federal vigente. E, por conseguinte, Inconstitucionalidade seria o que está em desacordo com o proposto pela lei maior.

O exame das normas jurídicas deve ser iniciado pela Constituição Federal (norma máxima), que ilumina todo o sistema normativo (NUNES, 2015, p. 50).

Nunes (2015, p. 50) informa que essa verificação deve ser feita de forma dedutiva para daí o interprete determinar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade da norma infraconstitucional:

“O interprete poderá ir verificando a adequação e constitucionalidade das normas infraconstitucionais que pretende estudar.
A inconstitucionalidade ele resolverá, como o próprio nome diz, apontando o vício fatal na norma infraconstitucional.”

Por isso, antes de se determinar a constitucionalidade ou não de uma forma infraconstitucional é necessário que se faça uma verificação de análise e raciocínio da mesma em relação à Constituição Federal.

6.1 Inconstitucionalidade

O Decreto foi alvo de duras críticas tanto da mídia, como de intelectuais e juristas sobre sua constitucionalidade do decreto e de um possível golpe. Para Cunha e Guimarães (2015) a polêmica começou com a publicação de primeira página do jornal O Estado de São Paulo com o alerta do risco da criação do “poder paralelo” pelo decreto.

Esta matéria deu vazão as mais diversas manifestações sobre o conteúdo do decreto, principalmente aquelas que afirmavam que o Decreto diminuía o poder Legislativo ou de que o Decreto seria um golpe para a “Ditadura Petista”.

O Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, se posicionou diante da (in) constitucionalidade do decreto, em entrevista ao Jornal Nacional em 11 de julho de 2014:

“Acho que o Congresso tem razão de estar preocupado. Afeta já de maneira ainda mais frontal a legitimidade do Congresso, coloca em xeque a Casa, que tem de fato a representação popular. Então isso precisa ser discutido com muita calma e nós devemos, realmente, ter todo cuidado com esse tipo de movimento”.

Diante da declaração do Presidente do STF, a época, verifica-se uma apreensão do mesmo em relação ao Decreto. Ele não deixa claro seu posicionamento quando a inconstitucionalidade, porém, chama à atenção a diminuição do poder da Casa do Congresso – que detém a representação popular. Porém, esqueceu este que o Decreto é sobre a maior participação popular e não menor representação.

Reinaldo Azevedo, jornalista, publicou um artigo afirmando que a Constituição Federal defendia apenas a democracia representativa e por isso a democracia participativa apresentada no Decreto era inconstitucional (Cunha Filho e Guimarães Filho 2015, p.4).

Um posicionamento visivelmente contrário ao Decreto é o do jornalista Reinaldo Azevedo que sugeriu a inconstitucionalidade do decreto por permitir a participação direta do cidadão.

“A Constituição brasileira assegura o direito à livre manifestação e consagra a forma de democracia representativa: por meio de eleições livres, que escolhem o Parlamento. O que Dilma está fazendo, por decreto, é criar uma outra categoria de representação, que não passa pelo processo eletivo. Trata-se de uma iniciativa que busca corroer por dentro o regime democrático” (AZEVEDO, 2014 apud CUNHA E GUIMARÃES, 2015, p. 4).

O que o renomado jornalista esquece é que a democracia participativa está expressa na Constituição Brasileira, e que a democracia, bem como o cidadão, não tem o seu papel resumido apenas no voto. Pelo contrário, é a partir do voto que entra a democracia participativa, onde o cidadão pode questionar as ações dos seus representantes, participar das audiências públicas, promover um projeto de lei ou ainda participar das decisões do PDDU (Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano) para este ter legitimidade.

Cunha e Guimarães (2015, p.4) esclarece a opinião de Azevedo em outro ponto da seguinte forma: “os conselhos seriam meios que o governo federal utilizaria para contornar as forças sociais de oposição e impor sua vontade a toda a sociedade.”. Isto é, Azevedo afirma que o Decreto é um meio para a Ditadura Petista, já que este “cala a boca” da oposição indo de encontro com o direito da personalidade: direito de expressar opiniões.

Corroborando este entendimento Martins (2014, apud CUNHA E GUIMARÃES, 2015, p. 5) afirma que:

“A linha da proposta é tornar o Congresso Nacional uma Casa de tertúlias acadêmicas, pois os conselhos e comissões eleitos pelo “povo” serão aqueles que dirigirão o país. Por exemplo, a comissão encarregada da comunicação social poderá determinar que o ministério correspondente imponha restrição de conteúdo à impressa, a pretexto de que é esta a “vontade do povo”, que será “obrigado” a atender aos apelos populares”.

O que esses dois intelectuais esqueceram de informar é como a participação direta do povo é um meio para a ditadura, já que o que Ives Gandra Martins informa é uma redução da atuação da mídia, mas não pela participação do povo e sim pela mera justificativa deste. O que através da participação indireta também poderia ocorrer. No entanto, com a participação direta do povo esta limitação deverá ter a participação do povo para ser legitimada.

Compreende desses posicionamentos um receio diante de uma maior participação da população na política. Com a contínua evolução da democracia no país é chegada a hora de deixar a população interagir mais com este setor da sociedade.

Porém foram as críticas dos juristas as mais duras, tanto que no Congresso Nacional surgiram diversos Projetos de Decreto Legislativo para suspender o Decreto da Presidente da República. Renan Calheiros (2014), o Presidente do Senado, atacou a constitucionalidade do decreto quando afirmou: “Quem representa o povo é o Congresso Nacional e, por esse motivo, o ideal é que a proposta seja enviada através de um projeto de lei ou mesmo através de uma medida provisória, para que seja aqui aprimorada.”.

No entanto, o senador precisa ser lembrado que ele é parte do povo. Então o povo é representado pelo próprio povo. O que o Decreto faz é ampliar a participação dos cidadãos nas decisões que influenciam toda a sociedade, fazendo com que a população expanda a sua participação, atualmente limitada, na política do país.

O que leva a crer que toda a discussão sobre a constitucionalidade do decreto é fruto de uma fobia das massas, ou seja, receio de uma maior participação popular na política do Brasil. Corroborando este entendimento os autores Cunha e Guimarães (2015, p.7) apontam o posicionamento de Schumpeter (1984) que determina que a ação do povo termina com a eleição dos políticos e a partir deste momento a ação política é apenas assunto da pessoa eleita e não mais dos eleitores.

Mais uma vez fazendo referência apenas a democracia representativa e limitando a participação do povo ao voto. Porém as decisões tomadas pelos eleitos interferem de forma direta ou indireta em toda a sociedade e por isso a ação política não pode ser assunto apenas desses.

Outro teórico apontado por Cunha e Guimarães (2015, p.8) que apoia esta visão conservadora é Schimitt (1928) afirmando que o povo não pode participar de uma discussão de argumentos e contra-argumentos devido à capacidade limitada de discutir por si mesmo, apenas podendo votar a responder a perguntas de “sim” ou “não”, sendo do parlamento a obrigação de representar a razão e a cultura nacional.

Existem dois pontos no posicionamento de Schimitt que devem ser abordados de forma distinta. Inicialmente vale ressaltar que os eleitos são membros do povo e por isso é evidente que uma parcela deste tem a capacidade – exigida por este – para participar das discussões. O outro ponto é a capacidade, que este duvida que os brasileiros possuam para participar das discussões política. Uma vez que é possível que o povo brasileiro tenha a capacidade para escolher aquele que melhor lhe representa, porém não apresenta condições mentais para participar de uma discussão com argumentos e contra-argumentos para defender seu ponto de vista.

Esses pensamentos retrógrados afetam a evolução da população brasileira e ainda são utilizados como desculpa pelas pessoas que querem se isentar da “culpa” – mesmo que indireta – das ações políticas que regem o país atualmente.

Pode ser que a maioria da população realmente não esteja munida de capacidade senso-critica para poder participar destas discussões políticas. No entanto, nem o ser mais ignorante, apesar de influenciável, é incapaz de mostrar os motivos positivos e negativos das suas escolhas.

Além de que os representantes do povo saem da população e não necessariamente das minorias. Um exemplo claro é o ex-presidente da república, Luís Inácio Lula da Silva que era semianalfabeto (que é uma maioria) e foi um dos presidentes que mais desenvolveu a estrutura financeira do país. E se o cidadão tem a capacidade de escolher aquele que melhor irá te representar, também terá capacidade para expressar sua opinião diante das discussões políticas.

O que se discute, diante da (in) constitucionalidade do Decreto, não é necessariamente a sua efetiva constitucionalidade e sim a forma como a maior participação popular irá afetar o poder dos eleitos. Por isso, foi condenado por muitos como o quarto poder.

6.2 Constitucionalidade

Como a constitucionalidade de uma norma infraconstitucional é feita diante da verificação de sua concordância com a própria Constituição Federal, percebe-se que o primeiro passo para determinar sua constitucionalidade ou não é fazer essa análise jurídica e não política, como os defensores da inconstitucionalidade tentam fazer.

Inicialmente, percebe-se que o fundamento para o Decreto é válido, visto que, o intuito do Decreto (autônomo) é não estar vinculado a lei anterior, e é de competência privativa do presidente da república e versa sobre a organização e funcionamento da administração.

Durante uma leitura minuciosa do decreto percebe-se que em momento algum existem dispositivos que vão de encontro ao determinado pela Constituição, pelo contrário, nota-se que ocorre a observância dos dispostos na CRFB com o objetivo de esclarecer seu entendimento e aumentar sua eficácia.

No Manifesto de apoio ao Decreto lançado por 150 juristas, dentre os quais se encontravam Fábio Konder Comparato, Dalmo de Abreu Dallari, José Geraldo de Sousa Junior e Calixto Salomão Filho, estes defendem sua constitucionalidade respondendo ao argumento daqueles que apontam a inconstitucionalidade. Segundo o Manifesto o Decreto não viola nem usurpa das atribuições da Casa do Congresso, ele simplesmente organiza as instâncias e estabelece as diretrizes para o funcionamento da participação social. Sem contar que respeita os limites estabelecidos pela Constituição Federal no artigo 84, VI, a. (Cunha Filho, Guimarães Filho, 2015).

Outra figura política que defende a constitucionalidade do Decreto é Gilson Dipp, Ministro do Supremo Tribunal de Justiça. Que vê as critica ao decreto com mera fragilidade as bases políticas. Porém não vê o Decreto como obstáculo à participação eleitoral – propaganda eleitoral, mobilização dos partidos – e também não o vê como obstáculo das demais formas de participação popular. Por isso, enxerga o Decreto como meio de expandir a democracia representativa.

Faz-se necessário entender então o que é uma democracia representativa. Segundo De Plácido e Silva (2010, p. 247), bem resumidamente, Democracia Representativa é "poder do povo". Porém apesar de um conceito resumido fica claro o posicionamento de Gilson Dipp em relação à constitucionalidade do Decreto. Visto que, o Decreto tem como objetivo ampliar a atuação popular nas decisões política, ou seja, investir no poder do povo no âmbito político.

CONCLUSÃO

Fica claro, que as discussões sobre a constitucionalidade do Decreto Presidencial têm um cunho mais político do que jurídico. E devido aos pensamentos medíocres e degradantes em relação às massas o ano de 2014 e 2015 foi inesperadamente marcado por diversas manifestações populares e sociais.

Através destas manifestações parte da população – que influenciou outra grande parte da população – passou a perceber que tem poder real na sociedade e por isso começou a pleitear seus direitos do único meio que imaginou ser possível: o grito. Pessoas encheram as ruas de todo o país e protestaram contra as injustiças sociais, as decisões políticas e pelo bem estar coletivo.

Diante disso percebe-se que o povo tem ciência das consequências das decisões dos políticos, mesmo que ainda, apenas uma parcela da população. Por isso fica o questionamento: porque o temor com a ampla participação do povo nas decisões política?

O que o Decreto faz é aumentar a participação popular na política e regulamentar esta participação. Porém para esta participação ser feita de forma ordenada e construtiva é necessário que a população tenha senso crítico e perceba a importância da sua participação para a construção de um país melhor.

Com todas as manifestações vê-se que o povo está tomando consciência que as decisões políticas afetam a toda a sociedade como um todo e por isso a sua participação tem uma importância muito grande para o desenvolvimento do país, ficando claro que a população brasileira está caminhando para se desenvolver em seres políticos.

Seres políticos, aqueles que fazem da democracia mais do que um regime político de representação, e sim, muito mais, um regime político de participação.

No entanto, apesar de toda essa evolução fica claro que a população brasileira está em desenvolvimento para um ser político. Por isso, a percepção de constitucionalidade do Decreto Presidencial é secundária diante da percepção de que a população brasileira, por conta da sua evolução histórica, não está preparada de forma critica e perspicaz para tomar decisões políticas que afetam uma nação.

Sendo assim, seria uma decisão mais acertada inserir essa participação de forma gradativa e contínua, dando meios para a continuidade da evolução do senso crítico humano diante das questões políticas, jurídicas, sociais e econômicas do país.

 

Referências
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Notas
[1] Artigo orientado pela profa. Tais Dórea de Carvalho Santos. Advogada. Sócia do Escritório Dórea, Guimarães & Costa Pinto. Mestre em Direito Público pela UFBA. Professora Universitária. Assessora Jurídica do Conselho Regional de Educação Física da 13ª Região – Bahia.


Informações Sobre o Autor

Lorena Santos Caldas

Advogada. Assessora da Presidência do Conselho Regional de Educação Física da 13 Região – Bahia


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