A fiscalização da suspensão condicional da pena e do processo pelas polícias militares. Controle das condições judiciais impostas ao sursis penal e processual

Resumo: Este artigo científico tem como objetivo demonstrar a importância da aplicação da pena na sociedade e a necessidade de fiscalização do Estado no cumprimento da sanção penal, em especial na utilização das Polícias Militares como órgão competente na fiscalização indireta das condicionantes do sursis penal e processual. Para tanto, é feita uma revisão bibliográfica sobre o tema, abordando os aspectos conceituais e a evolução histórica dos diplomas legais que tratam do assunto. Foi possível concluir com este estudo que é plenamente possível e aconselhável que as Polícias realizem a fiscalização indireta aos indivíduos que se encontram no período de prova do sursis penal e processual.[1]

Palavras-chave: Fiscalização do Sursis. Período de Prova. Polícia Militar.

I.  INTRODUÇÃO

Este estudo tem como objetivo analisar a fiscalização indireta do período de prova da suspensão condicional da pena e do processo, verificar os órgãos responsáveis estipulados na lei de execuções penais, sua efetiva atuação e na possibilidade de fiscalização por parte das Polícias Militares. Vemos que a lei de execuções e o Código de Processo Penal estipularam os órgãos que realizarão a fiscalização do período de prova, porém sabemos que não há em todas as cidades do País a presença física desses órgãos, e como solução apresentamos a possibilidade da utilização da Polícia Militar para suprir essa lacuna. Verificaremos que não há impeditivo legal para adoção de tal medida e que produzirá efeitos na esfera da segurança pública, diminuindo a sensação de impunidade gerando maior sensação de segurança buscando sempre a preservação da ordem pública.

II. Pena

A pena é a consequência imposta pelo Estado aos indivíduos que praticam um fato típico, ilícito e culpável, segundo diversos autores é parte essencial no convívio em sociedade, pois se constitui em um recurso do Estado de controle social e a efetiva aplicação do princípio da supremacia do interesse público perante o particular.

Segundo Fernando Capez (2011, pag. 384) a pena é,

 “sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade”.

Segundo Guilherme de Souza Nucci pena é “a sanção imposta pelo Estado, através da ação penal, ao criminoso, cuja finalidade é a retribuição ao delito perpetrado e a prevenção a novos crimes”.

Historicamente a primeira aplicação da pena que se tem relato é a aplicada a Eva, ainda no paraíso, que após ser incentivada pela serpente a comer a fruta proibida, e induzir Adão a cometer o mesmo ato, são punidos com a exclusão do paraíso, desde então, fora adotada a ideia de que para toda conduta desviante praticada por um membro da sociedade haverá uma resposta punitiva.

Segundo Cesar Roberto Bitencourt (2012, 316),

“a concepção do direito penal está intimamente relacionada com os efeitos que ele deve produzir, tanto sobre o indivíduo que é objeto da persecução estatal, como sobre a sociedade na qual atua. Além disso, é quase unânime, no mundo da ciência do Direito Penal, a afirmação de que a pena justifica-se por sua necessidade. Muñoz Conde (Introducción al Derecho Penal, Barcelona, Bosch, 1975, p. 33 e s) acredita que sem a pena não seria possível à convivência na sociedade de nossos dias. Coincidindo com Gimbernat Ordeig (Tiene un futuro la dogmática de la culpabilidad, p. 115, apud Estudios de Derecho Penal, 2. ed., Madrid, Civitas, 1981), entende que a pena constitui um recurso elementar com que conta o Estado, e ao qual recorre, quando necessário, para tornar possível a convivência entre os homens. Nesse sentido é possível deduzir que as modernas concepções do direito penal estão vinculadas às ideias de finalidade e função, o que explica sua estrita relação com as teorias da pena, meio mais característico de intervenção do Direito Penal”.

Por isso a importância do estudo das teorias da pena e a consequente reflexão crítica acerca das finalidades e funções que esta deve e pode desempenhar no marco atual das sociedades democráticas.

No decurso histórico do Direito Penal, da pena e do Estado, observam-se notórias rupturas, entre as quais se encontra a transição das concepções retributivas da pena às orientações utilitaristas (preventivas gerais ou especiais), passando por teorias unificadoras, até chegar às concepções mais modernas da prevenção geral positiva. Ao longo desta evolução, a pena deixou de ser explicada e justificada com base em argumentos polarizados, seja pela perspectiva retribucionista, seja pela perspectiva utilitarista, para passar a ser entendida a partir de uma compreensão abrangente das diferentes finalidades e funções que ela deve e pode desempenhar, respectivamente, num Estado democrático de Direito. Para o entendimento adequado do estágio atual do debate acerca dessas questões, é necessário analisar as diversas explicações e justificações teóricas que a doutrina tem dado à pena.

III. Finalidade das penas

Muito se discute sobre qual a finalidade da pena, teria ela um caráter repressivo e retributivo, ou seria mais um caráter preventivo e reeducativo, ao analisarmos o conceito de pena podemos chegar à conclusão de que esta não é apenas um castigo imposto ao indivíduo que comete alguma infração penal, mas possui também cunho preventivo e de ressocialização dos infratores. Diante dessas celeumas surgiram algumas teorias que visam elucidar essas discussões;

– Teoria absoluta ou retributiva;

Como característica principal das teorias absolutas a pena é vista como um mal, um castigo, ou seja, retribuição do mal causado pelo indivíduo a outra pessoa. São mais encontradas nos Estados absolutistas, onde é a figura do soberano que define o que é direito e moral, defende que possui um poder divino, dessa forma toda pessoa que atente contra o soberano estará por consequência atentando contra o próprio Deus. Concentra-se no soberano o Estado, a justiça e o poder legal.

Com a evolução da sociedade e o surgimento do mercantilismo o Estado até então absolutista avança no sentido de um Estado liberal, onde a pena deixa ter o fundamento na pessoa do soberano, passando a proteger os interesses da nova sociedade burguesa e proteção ao contrato social, ou seja, passa agora ser uma retribuição à perturbação da ordem jurídica adotada pela sociedade.

Partindo do pressuposto do contrato social, o indivíduo que contrariava o contrato social era qualificado como traidor, deixava de fazer parte daquele grupo social, era um rebelde em que a culpa poderia ser retribuída com uma pena.

– Teoria relativa ou preventiva;

Para os adeptos da teoria relativa a pena se justifica não para retribuir o fato delitivo e sim para prevenir a prática delitiva, ou seja, a pena deixa de ser concebida como um fim em si mesmo e passa ser entendida como um meio para alcance de fins futuros. A pena tem um fim prático e imediato de prevenção geral ou especial do crime. A prevenção é especial porque a pena objetiva a readaptação e a segregação social do criminoso como meio de impedi-lo de voltar a delinquir. A prevenção geral é representada pela intimidação dirigida ao ambiente social (as pessoas não delinquem porque têm medo de receber a punição).

A prevenção geral se divide em negativa e positiva, onde a prevenção negativa baseia-se na intimidação que a punição aplicada a um infrator gera na comunidade, pois se acredita que o indivíduo que tem pré-disposição à prática de fato delituoso ao ver a punição aplicada a terceiro que praticou ato contrario a norma irá se acovardar vendo que poderá ser punido. Já a prevenção positiva visa infundir a necessidade de respeito a determinados valores na sociedade.

A prevenção especial também se divide em negativa, que defende a prevenção pela neutralização em cárcere do indivíduo infrator da lei, impedindo que ele, pelo menos por um prazo determinado não volte a delinquir. Pela prevenção especial positiva a pena serve unicamente para fazer com que o infrator desista de cometer novos crimes.

– Teoria mista ou unificadora da pena

Também denominada como eclética ou conciliatória. A teoria mista, como o próprio nome já diz tenta englobar os conceitos utilizados pelas duas teorias anteriores, tanto o conceito de retribuição como os de prevenção.

Segundo essa teoria a pena deverá apresentar boas condições de prevenção geral e especial, compreendida e aceita pelo autor do delito e demais da comunidade, porém só atingirá essa qualidade se for uma pena proporcional a gravidade do ato praticado, além de necessária para manter a ordem social.

O Código Penal trata da aplicação da pena utilizando a teoria mista, dispondo sobre a necessidade de reprovação e a prevenção do crime.

“Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”.

O texto do artigo estipula ao magistrado que no momento da aplicação da pena deve observar dois requisitos, a reprovação da conduta (que deve ser entendido como retribuição), e da prevenção do crime. A retribuição funciona como uma espécie de pagamento que o infrator da lei realiza perante a sociedade, visando compensar seu erro, essa é o fundamento proposto pela teoria absoluta. Já ao conceito de prevenção estipulado no artigo, tem fundamento nas teorias relativas, que trata da prevenção geral e prevenção especial, já explicada quando abordada a teoria relativa. Percebemos pelo referido artigo que o Código Penal adotou a teoria conciliatória, pois busca conciliar a ideia principal de ambas as teorias, absoluta e relativa.

IV. SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA

A suspensão condicional da pena surge como forma amenizar os males causados pela pena de prisão, que verificamos não possui um índice satisfatório de reintegração dos indivíduos à sociedade, visando que esses não voltem a delinquir.

É uma medida alternativa à prisão que visa evitar a pena privativa de liberdade e o encarceramento do condenado desde que cumpra com alguns requisitos. Permite ao condenado não ser privado de sua liberdade durante um período determinado de tempo, chamado de período de prova, e ao final se cumprir com as condições a ele estabelecidas restará cumprida a pena.

Como disse Cuello Calón(La moderna penología, cit., p. 638), “não só constitui um substitutivo penal das penas privativas de liberdade, como também um meio de eficácia educadora, pois, durante o período de prova, o condenado se habitua a uma vida ordenada e conforme com a lei”.

 No dizer de Jescheck (Tratado de Derecho Penal, cit., p. 1153), “a suspensão condicional da pena é um meio autônomo de reação jurídico-penal que tem várias possibilidades de eficácia”.

Para Aníbal Bruno (1967, p. 255). A “suspensão condicional da pena é o ato pelo qual o juiz, condenando o delinquente primário, não perigoso, à pena detentiva de curta duração, suspende a execução da mesma, ficando o sentenciado em liberdade sob determinadas condições”.

Juarez Cirino dos Santos (1985, p. 255), diz que a suspensão condicional da pena “constitui substitutivo penal impeditivo da execução e extintivo da pena privativa de liberdade aplicada, decidido pelo juiz na sentença criminal, com o objetivo de evitar os malefícios da prisão…”.

Discute-se se a suspensão condicional da pena é um direito ou concessão do preso, pela redação do Art. 77 do CP, “a execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que…”, leva a entender que se trata de uma faculdade do juiz, porém esse não é o melhor entendimento, pois verificamos ao analisar o artigo 157 da LEP, “o juiz ou tribunal, na sentença que aplicar pena privativa de liberdade, na situação determinada no artigo anterior, deverá pronunciar-se, motivadamente, sobre a suspensão condicional, quer a conceda, quer a denegue”, percebemos que determina que o juiz se pronuncie sobre a suspensão condicional, concedendo ou denegando, ou seja, sempre que o condenado fizer jus a o “sursis” deverá o juiz conceder o benefício ao mesmo, portanto, verificamos tratar-se de um direito subjetivo do réu.

– Requisitos para concessão;

Os requisitos se subdividem em objetivos e subjetivos, tendo como critérios objetivos àqueles disciplinados pelo artigo 77 do CP que em seu caput trás a espécie e o quantum da pena, pena privativa de liberdade não superior a dois anos, por fim o critério objetivo trata da impossibilidade de substituição por pena restritiva de direitos, o objetivo é a proteção do réu, pois caso seja revogado o “sursis” o condenado terá de cumprir toda a pena privativa de liberdade, e ainda via de regra, a pena restritiva é mais benéfica ao réu.

Os critérios subjetivos tratam da necessidade do indivíduo não ser reincidente em crime doloso, desta forma, fará jus ao instituto da suspensão condicional da pena aquele que já fora condenado em decisão transitada em julgado por crime culposo nos últimos cinco anos.

Há ainda outro critério que é a prognose de não voltar a delinquir, para isso deverá ser analisado a culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do réu, motivos e circunstâncias do crime, sendo esses requisitos positivos o réu será contemplado pelo instituto, caso não sejam os critérios positivos a favor do réu não deverá haver a concessão do “sursis”.

Os requisitos para concessão do sursis visam que esse benefício atinja somente os criminosos eventuais e não àqueles que fazem do crime sua profissão, os denominados criminosos habituais, pois não seria justo conceder um benefício à pessoa que faz do crime seu instrumento de trabalho, vive delinquindo, são eternos reincidentes. Diferentemente daqueles que por uma única atitude criminosa, seja por culpa ou por um impulso que não conseguiu controlar, mas é presumível que não voltará a delinquir.

– Espécies de suspensão condicional da pena;

Há quatro formas de “sursis”, o simples, especial, etário e o humanitário. Sursis simples; previsto no art. 77 do código penal, o condenado se sujeita ao cumprimento de prestação de serviços a comunidade ou de limitação de finais de semana, tendo como condição obrigatória a execução em pelo menos no primeiro ano de prazo.

Sursis especial; nessa modalidade o condenado é dispensado do cumprimento das medidas previstas no art. 77 do CP, prestação de serviços à comunidade ou limitação de final de semana, e submete-se às penas de proibição de frequentar determinados lugares, a proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização judicial, ou o comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades. Essa espécie é concedida excepcionalmente para o condenado que cumpra com todos os requisitos previstos no sursis simples além de reparar o dano causado, salvo a impossibilidade de fazê-lo e ter as circunstâncias do art. 59 do CP favoráveis, segundo Luiz Regis Prado (Curso de Direito Penal Brasileiro, 2012), “é a de mínima culpabilidade, irretocáveis os antecedentes e de boa índole a personalidade, bem como relevantes os motivos e favoráveis às circunstâncias”. Nessa hipótese de sursis se qualquer uma dessas condições for desfavorável ao réu impedirá a concessão do sursis especial, restando apenas a possibilidade da obtenção do sursis simples.

Sursis etário; destinado aos condenados com idade igual ou superior a 70 (setenta) anos, à época da condenação, desde que a pena privativa de liberdade seja inferior a quatro anos, onde o condenado deverá se submeter a um período de prova que variará de 4 (quatro)a 6 (seis anos). Este instituto leva em consideração o fator “velhice”, baseando-se na baixa taxa de reincidência dos indivíduos dessa faixa etária.

Sursis humanitário; permite ao condenado a pena não superior a quatro anos e que possua problemas graves de saúde o benefício do sursis visando o não agravamento de sua situação, observando que há um período de prova de quatro a seis anos.

– Condições do Sursis Penal;

As condições do sursis podem ser legal ou judicial, o legal tem natureza e conteúdo previamente estipulados em lei, e variam de acordo com o tipo de sursis. Condição judicial é aquela imposta discricionariamente pelo juiz de maneira no ato da sentença, sempre se observando as condições pessoais do condenado, sendo vedada a aplicação de medidas que violem os direitos fundamentais da pessoa humana.

– Período de prova;

Período de prova é o lapso temporal que o beneficiário tem a pena suspensa desde que cumpra com algumas condições impostas em troca de sua liberdade.

O prazo do período de prova nos sursis simples e especial varia de dois a quatro anos, já nos sursis etário e humanitário pode variar de quatro a seis anos.

– Prorrogação e revogação do período de prova;

Caso o executado pratique nova infração penal no período de prova será prorrogado automaticamente o período de prova até a decisão em definitiva desse novo delito, conforme estipulado no Código Penal.

“Art. 81. A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário:

§ 2.º Se o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção, considera-se prorrogado o prazo da suspensão até o julgamento definitivo.”

A ideia da dilação do período de prova trata da dúvida que paira sobre o merecimento do indivíduo beneficiado pelo sursis penal que está sendo processado por novo crime. A prorrogação do período de prova se dará automaticamente toda vez que o indivíduo cometer novo crime, independente de decisão judicial transitada em julgado.

A decisão que concede o sursis não faz coisa julgada material por estar subordinada à cláusula rebus sic stantibus, que trata da teoria da imprevisão, pode ser lida como “estando as coisas assim”, ou “enquanto permanecerem desse modo”, dessa forma, há duas situações de revogação do sursis, revogação obrigatória ou facultativa.

Revogação obrigatória está disposta no artigo 81 do Código Penal ao tratar nova condenação, em sentença irrecorrível, por cometimento de crime doloso, pouco importando se o crime foi praticado antes ou depois do início do período de prova. Haverá a revogação caso o condenado deixe de cumprir com as condições estipuladas no art. 78 §1° do CP, que trata da prestação de serviços à comunidade ou a limitação de finais de semanas.

Após a alteração do art. 51 do CP pela lei 9.268/96 que trata da impossibilidade da conversão em pena privativa de liberdade por insolvência ou frustação da execução não caberá a revogação do sursis quando o réu deixa de solver, quando tinha condições de fazer, a pena de multa estipulada ou a reparação do dano causado.

Revogação facultativa trata do descumprimento das outras condições estipuladas pelo juiz no momento da concessão do sursis especial ou outras condições judiciais impostas pelo juiz. Nessas hipóteses fica a critério do juiz se o não cumprimento das condições estipuladas gerará a revogação, ou se prorrogará o período de prova, ou ainda se manterá as condições já estipuladas.

V. Suspensão Condicional do Processo

A suspensão condicional do processo, conhecido como sursis processual, é a interrupção do curso processual, durante um período estipulado que poderá levar a extinção do processo se o indivíduo cumprir com algumas condições impostas a ele pelo juiz, ou seja, é a paralização condicional e temporária do processo, cumpridas certas condições fixadas durante certo período, denominado período de prova.

Segundo Guilherme Souza Nucci, a suspensão condicional do processo,

 “trata”-se de um instituto de política criminal, benéfico ao acusado, proporcionando a suspensão do curso do processo, após o recebimento da denúncia, desde que o crime imputado ao réu não tenha pena mínima superior a um ano, mediante o cumprimento de determinadas condições legais, como o fito de atingir a extinção da punibilidade, sem necessidade do julgamento do mérito propriamente dito.

O instituto da Suspensão Condicional do Processo, também denominado como "sursis antecipado" ou do "sursis processual" está previsto no art. 89 da Lei 9.099/95, sendo considerado pela doutrina como uma das maiores inovações introduzidas no sistema processual penal. Fernando Capez define como,

“instituto despenalizador, criado como alternativa à pena privativa de liberdade, pelo qual se permite a suspensão do processo, por um determinado período e mediante certas condições. Decorrido esse prazo, sem que o réu tenha dado causa à revogação do benefício, o processo será extinto, sem que tenha sido proferida nenhuma sentença".

Trata-se de um instituto que, igualmente a suspensão da pena, tem o caráter despenalizador evitando o encarceramento de indivíduos que cometem crimes de menor potencial ofensivo. Foi instituído pela Lei 9.099/95 entre outras medidas que visam a despenalização de condutas consideradas menos gravosas pelo legislador.

Uma questão a ser levada em conta é se a suspensão condicional do processo afronta os princípios de presunção de inocência, contraditório e o da ampla defesa. Entendemos que não, pois não é discutida nenhuma responsabilidade tampouco é imposto pena a ser cumprida e por consequência não gera antecedentes criminais. O que de fato ocorre é a imposição de condições a serem cumpridas por determinado prazo de tempo, caso o acusado não aceite a proposta será dado prosseguimento a ação penal, é uma escolha apresentada ao réu, se este achar mais benéfico dar prosseguimento ao processo, assim será feito.

– Requisitos para concessão

O referido art. 89 da Lei 9.099/95 estabelece os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, a saber:

Como um dos requisitos objetivos a lei estipula como pena mínima cominada à infração penal o limite de um ano de pena em abstrato, atingindo não só as infrações de menor potencial, como também as de média ofensividade, abrangendo os crimes e as contravenções penais. Deve ainda, tratar-se de ação penal pública incondicionada, ou ser efetuada a representação, nos casos de ação penal pública condicionada e em ambas as hipóteses, não ser o caso de arquivamento de termo circunstanciado, em relação às ações penais privadas não é admitido a suspensão do processo com base no princípio da disponibilidade, como decidiu o STJ, “Nos crimes em que o jus persequendi é exercido por ação de iniciativa privada, como tal o crime de injúria, é impróprio o uso do instituto da suspensão condicional do processo, previsto no art. 89 da Lei 9.099/95”. Exceção feita às ações penais privadas subsidiárias das públicas, pois estas ainda mantém o caráter de públicas. 

A lei estipula ainda que, não pode haver condenação anterior por outro crime, ou seja, não pode o autor ter sido condenado por sentença definitiva pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, e por fim, não ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela transação.

Outra obrigatoriedade é a ausência de outro processo em curso, porém ao entender do autor e juiz de direito João Hora Neto, igualmente entendido por nós, trata-se de um preceito inconstitucional, pois fere o princípio da presunção de inocência, que pode causar um dano irreparável ao réu, pois imagine uma situação em que seja negado o benefício do sursis processual ao acusado, sob o argumento de estar respondendo por outra infração penal. Imagina se após a denegação de um direito subjetivo do réu, baseado no argumento acima exposto, o acusado é inocentado no outro processo, como seria reparado esse dano causado ao mesmo, por esse motivo entendemos que este requisito não deve ser observado no momento da concessão do benefício.

– Requisitos subjetivos

Quando os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicar a adoção da medida. Estar presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (CP, art. 77), já explicado nos requisitos subjetivos para concessão do sursis penal.

– Condições

O juiz poderá suspender o processo submetendo ao acusado pelo período de prova, há algumas condições, que podem ser a, proibição de frequentar determinados lugares, proibir de ausentar-se da comarca onde reside sem autorização judicial, comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar suas atividades, dentre outras que entender adequadas as condições pessoais do indivíduo. A reparação do dano causado, não é nesse momento condição imposta para concessão, pois é na verdade uma condição de extinção da punibilidade. Nesse ponto devemos observar que o juiz esta limitado a condições que não coloquem a pessoa em situação de vexatória ou que atentem contra sua dignidade pessoal, exemplo de condição indigna seria a obrigação de frequentar cultos religiosos, pois atentaria contra a liberdade de religião da pessoa.

– Revogação

A revogação pode ser obrigatória, quando o beneficiário não efetuar, sem motivo justo, a reparação do dano causado ou segundo a lei quando for processado por outro crime.

Será facultada ao juiz a revogação da suspensão condicional do processo quando o acusado for processado por contravenção penal ou descumprir com alguma condição imposta pelo juiz no momento da concessão do benefício.

Ocorrendo a revogação do benefício o processo voltará a tramitar normalmente, observando que não ocorrerá a prescrição durante a suspensão do processo.

 Encerrado o período de prova, de dois a quatro anos, sem que o réu tenha dado causa à revogação do benefício, o juiz declarará extinta a punibilidade do agente. Vale salientar que somente após a declaração do juiz competente é que será extinta a punibilidade, e não apenas com o final do período de prova.

Aceita a proposta de suspensão condicional do processo formulada pelo MP, esta se torna irretratável, salvo em caso de comprovado vício de consentimento, tais como erro ou coação. Se o acusado não aceitar a proposta, o processo prosseguirá. Nesse instituto o titular para propor o instituto é o Ministério Público, titular da ação, e não o juiz como é o caso da suspensão da pena, não podendo o juiz reconhecer de ofício. Caso discorde com a decisão adotada pelo parquet deverá encaminhar os autos ao Procurador Geral da Justiça, para que esse se pronuncie a respeito.

Trataremos de algumas diferenças entre o Sursis penal e o Sursis processual, a suspensão condicional do processo esta prevista no art.89 da Lei 9099/95 e a suspensão condicional da pena no art.77 do CP.

O cabimento do sursis penal é nas condenações não superiores a 2 (dois) anos no sursis simples e especial e não superior a 4 (quatro) anos no etário ou humanitário. Na lei 9605/98, art.16, condenações até 3 (três) anos. No sursis processual pena mínima cominada até 1 (um) ano.

No sursis penal o benefício é concedido na sentença, no processual é no oferecimento da denúncia. No penal há condenação, no processual não. No penal há culpabilidade, no processual não há formação do juízo de culpabilidade, não é julgado o mérito. No penal há consequências penais e extra penais da condenação, só a execução da pena é suspensa, já no processual não há qualquer efeito, não houve condenação.

Sursis penal não depende de aceitação do réu, ele pode até recusar que será concedido, não depende da sua aceitação. Sursis processual depende de aceitação do réu e do seu defensor. O sursis penal não influencia em nada a prescrição, o sursis processual suspende o prazo prescricional.

Sursis penal é revogado e fiscalizado pelo juiz da execução penal, o sursis processual pelo juiz do processo. Sursis penal extingue a pena, processual extingue a punibilidade. No sursis penal a revogação gera o cumprimento da pena, no processual será réu será processado.

Para melhor visualização vejamos a tabela a baixo;

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VI Fiscalização do sursis penal e processual

Nesse momento trataremos da fiscalização da competência tanto da fiscalização do sursis penal como do sursis processual.

Primeiramente trataremos da fiscalização das condições na suspensão da pena, que esta expressa na Lei de execuções penais, estabelece nos §§ 3º a 6º do art. 158 da Lei de Execução Penal as seguintes regras:

“§ 3º A fiscalização do cumprimento das condições, regulada nos Estados, Territórios e Distrito Federal por normas supletivas, será atribuída a serviço social penitenciário, patronato, Conselho da Comunidade ou instituição beneficiada com a prestação de serviços, inspecionados pelo Conselho Penitenciário, pelo Ministério Público, ou ambos, devendo o juiz da execução suprir, por ato, a falta das normas supletivas;

§ 4º O beneficiário, ao comparecer periodicamente à entidade fiscalizadora, para comprovar a observância das condições a que está sujeito, comunicará, também, a sua ocupação e os salários ou proventos de que vive.

§ 5º A entidade fiscalizadora deverá comunicar imediatamente ao órgão de inspeção, para os fins legais, qualquer fato capaz de acarretar a revogação do benefício, a prorrogação do prazo ou a modificação das condições.

§ 6º Se for permitido ao beneficiário mudar-se, será feita comunicação ao juiz e à entidade fiscalizadora do local da nova residência, aos qual o primeiro deverá apresentar-se imediatamente.”

O Ministério Público é a uma das instituições responsáveis pela fiscalização do cumprimento da execução da pena, incluindo as condicionantes estipuladas na concessão do sursis penal. A intervenção do MP será obrigatória sempre que tomar conhecimento do descumprimento de alguma condicionante, como dispõe o Art. 68 da Lei de Execução Penal;

“Art. 68. Incumbe, ainda, ao Ministério Público;

e) a conversão de penas, a progressão ou regressão nos regimes e a revogação da suspensão condicional da pena e do livramento condicional;”

Conselho Penitenciário segundo os arts. 69 e 70 da LEP, é órgão consultivo e fiscalizador da execução da pena, é composto por membros nomeados pelo Governador do Estado, Distrito Federal e dos Territórios, dentre professores e profissionais da área penal e ciências correlatas e ainda por membros da comunidade.

Patronato Público ou Particular presta-se a dar assistência aos albergados e aos egressos (art. 78 da Lei n° 7210/84), apoiando e orientando na missão de reintegrá-los a sociedade, além de atuarem na fiscalização do cumprimento da pena, como está disposto no art. 79 da LEP;

“Art. 79. Incumbe também ao Patronato:

I – orientar os condenados à pena restritiva de direitos;

II – fiscalizar o cumprimento das penas de prestação de serviço a comunidade e de limitação de fim de semana;

III – colaborar na fiscalização do cumprimento das condições da suspensão e do livramento condicional.”

Conselho da comunidade é um órgão composto por, no mínimo, um representante de associação comercial ou industrial, por um advogado indicado pela OAB, deverá ainda ter um defensor público e por fim um assistente social. Tem a incumbência de comparecer em estabelecimentos penais, entrevistar presos, apresentar relatórios mensais ao juiz da execução e ao Conselho Penitenciário.

Passaremos a abordar agora sobre a fiscalização do período de prova na suspensão do processo, que é de competência do juízo processante, e não do juízo de execuções penais, diferente do que ocorre na suspensão da pena.

Conforme jurisprudência a seguir;

“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. SURSIS PROCESSUAL. COMPETÊNCIA PARA O ACOMPANHAMENTO DO CUMPRIMENTO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE É DO JUÍZO QUE HOMOLOGOU A SUSPENSÃO. I. A MEDIDA ALTERNATIVA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE É CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO, IN CASU, NÃO SE CUIDA DE SUSPENSÃO DA PENA, LOGO, NÃO HÁ DE SE FALAR EM COMPETÊNCIA DA VEPEMA PARA PROCEDER AO ACOMPANHAMENTO DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO ALTERNATIVO IMPOSTO. II. A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO – E NÃO DA PENA – REFERE-SE A BENEFÍCIO CONCEDIDO AO ACUSADO ANTES DO OFERECIMENTO DA DENÚNCIA, É SITUAÇÃO EM QUE NÃO HÁ DE SE FALAR EM CONDENAÇÃO, MUITO MENOS DE PENA A SER EXECUTADA. III. OBSERVANDO-SE NÃO SE TRATAR DE PENA E SIM DE CONDIÇÃO DA SUSPENSÃO DO PROCESSO, PREESTABELECIDAS PELO JUÍZO DE CONHECIMENTO, SE NÃO CUMPRIDAS, ACARRETA O RETORNO DOS AUTOS AO SEU CURSO NORMAL DE PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DE MÉRITO, POR ESTE MOTIVO, O PROCESSO DEVE PERMANECER NO JUÍZO DE ORIGEM, A QUEM INCUMBE SUSPENDER O PROCESSO, IMPOR CONDIÇÕES, DECLARAR EXTINTA A PUNIBILIDADE DO AGENTE OU, SE FOR O CASO, REVOGAR O BENEFÍCIO. IV. CONFLITO JULGADO IMPROCEDENTE PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO SUSCITANTE, PARA ACOMPANHAR O CUMPRIMENTO DA MEDIDA ALTERNATIVA IMPOSTA NOS AUTOS DE Nº. 2009.04.1.012387-4.” (TJ-DF – CCP: 148703520108070000 DF 0014870-35.2010.807.0000, Relator: ALFEU MACHADO, Data de Julgamento: 29/11/2010, Câmara Criminal, Data de Publicação: 02/12/2010, DJ-e Pág. 67).

Como vimos a fiscalização direta dos requisitos da suspensão condicional da pena e do processo é atribuída aos órgãos judiciais os de execução penal, aos serviços sociais penais também a própria entidade em que o condenado presta os serviços ou ainda órgãos privados. A regulamentação da fiscalização do sursis é concorrente entre as leis de execução penal e às leis estaduais complementadas pelo juiz da execução penal. Cada Estado disporá os de leis que regulem a atuação dos servidores quanto os procedimentos da fiscalização.

Verificamos ao estudar a Lei de Execução Penal e a Lei 9099/95 que em nenhum momento é citado as Polícias, em especial as Polícias Militares, na fiscalização das condições estabelecidas na concessão do sursis penal processual, o que entendemos ser um erro, pois não há órgão que esteja mais presente diuturnamente e em todo o território do que a Polícia Militar Estadual, dessa forma, as Polícias Militares deveriam ter acesso às informações que regem a execução da pena do indivíduo, e, por conseguinte, realizar a fiscalização indireta do cumprimento do “sursis”. Entendemos ainda que seria necessário um meio de comunicação direto entre as Polícias Militares o Ministério Público e o Juiz de Execução Penal.

Entendemos que a falta de fiscalização gera a sensação de impunidade, que leva a falsa ideia de que o crime compensa, podendo aumentar o número de pessoas que se aventurem no mundo de crimes. Percebemos hoje a nítida postura do direito penal mínimo, porém ao deixarmos de fiscalizar as condições impostas para evitar o encarceramento em massa podemos estar caminhando para a abolição do direito penal, onde cada vez mais são toleradas condutas desviantes pela sociedade e pelos meios de coerção estatais.

Todos os órgãos destinados à fiscalização do período de prova do “sursis” penal e processual possuem como característica principal a fiscalização dos órgãos de cumprimento das penas, o enfoque, portanto, não é o condenado ou o acusado, mas as entidades que fazem parte da consecução do cumprimento da pena.

Não acreditamos que devam ser destituídos os outros órgãos da condição de fiscalizadores e atribuir as Polícias como principal instituição fiscalizadora do cumprimento da suspensão condicional da pena, mas sim, que deva atuar de forma complementar a fiscalização dos demais órgãos responsáveis, pois não há de se entender que seja razoável que em uma abordagem policial a instituição responsável pela segurança pública não tenha informação das restrições pessoais que foram impostas ao condenado como forma de evitar a pena privativa de liberdade, ou que permaneçam horas na delegacia de polícia para que essa tome as medidas necessárias.

Ao analisarmos a lei de execução penal em seu artigo 158 § 3°, diz que poderá o juiz da execução complementar as normas referentes ao cumprimento do sursis penal, portando não há impeditivo legal na criação de um canal direto entre as Polícias Militares e os juízes do processo ou da execução penal, podendo ocorrer através de mero documento encaminhado pelo comandante de companhia a vara de execução penal relatando o possível descumprimento de infração imposta cometida pelo condenado.

O descumprimento de uma das condições estabelecidas para concessão do sursis penal/processual não é considerado como conduta criminosa, trata-se apenas do descumprimento de uma condição penal legal, imposta por ordem judicial, cometida pelo infrator, desta forma, a revogação ocorrerá após a analise da autoridade competente, sendo assim, não haveria a necessidade da condução do indivíduo ao distrito policial, por não se tratar de flagrante delito de crime.

Como forma de melhoria na fiscalização e otimização do tempo, defendemos a criação de uma parceria entre Polícia Militar e Poder Judiciário na fiscalização do cumprimento da pena, criando um canal de comunicação que poderá ocorrer por meio de Boletim de Ocorrência Policial Militar, ou outro documento estabelecido, direcionado pelo comandante de companhia, que informará ao juiz de execução que foi averiguado uma suposta falta disciplinar cometida por um réu beneficiado pela concessão do sursis, cabendo ao juiz tomar as medidas cabíveis em relação àquele indivíduo.

Imaginemos uma situação em que é abordado um cidadão, em atitude suspeita, por volta das 2 (duas) horas da  madrugada e que com o referido abordado nada de ilícito seja encontrado, porém ao efetuar a consulta da situação criminal deste indivíduo junto ao COPOM, constata-se que este é beneficiário pela Lei 9.099/95, ou no caso sursis processual e deveria estar recolhido na sua residência às 22:00 horas. Nos dias atuais só há duas opções a serem tomadas pelos policiais, a primeira seria liberar o indivíduo por falta de informação a respeito das condições pessoais do abordado e a segunda seria conduzir o abordado ao distrito policial para verificação dos dados e elaboração do boletim de ocorrência da polícia civil.

Ambas as opções a nosso ver possui grandes falhas, pois a primeira, caso o indivíduo esteja descumprindo com alguma condição que poderia ensejar na revogação do benefício, ao ser liberado estará sendo desconstruindo todo um sistema criado para a reeducação do infrator da lei, pois o leva crer que pode cometer infrações penais que nada lhe acontecerá, gerando a ideia de impunidade ao infrator e aos demais membros da comunidade.

A segunda alternativa também apresenta problemas cruciais, o primeiro é o fato dos policiais estarem restringindo a liberdade do indivíduo por mais tempo que deveriam, caso o sujeito não esteja incorrendo em nenhuma medida que acarretaria na revogação do benefício, e o outro problema verificado é que mesmo o indivíduo incorrendo em alguma infração, o tempo perdido pelos policiais na condução do infrator até o distrito policial e o aguardo da elaboração do boletim de ocorrência, para que ao final a pessoa seja liberada, e o documento encaminhado ao órgão competente. Percebemos que nenhuma das alternativas propostas não são plausíveis.

Como forma de solução para esse problema propomos uma parceria entre a Polícia Militar e o Poder Judiciário local, visando uma troca de informações entre esses órgãos que dê a possibilidade aos policiais em abordagem verificar a real situação do averiguado junto ao COPOM e que possibilite a informação ao juízo competente de uma possível quebra de uma condição imposta por àquela autoridade.

Entendemos que o melhor a ser feito é que os policiais no próprio local da abordagem preencham o BOPM, com todos os dados do abordado, como, local, horário, possíveis testemunhas, entre outros, descrevam o histórico da ocorrência, e após liberem o indivíduo, encaminhando o documento ao comandante de companhia, que após elaborará documento endereçado ao juízo competente.

Estudando outros estados verificamos que o Estado de Minas Gerais já concede à possibilidade da Polícia Militar a hipótese de fiscalização indireta dos condenados que apenados a penas restritivas de direitos e também aos beneficiados pelo sursis. Transcorremos a seguir o texto de um projeto implantado em duas cidades mineiras.

“Objeto do projeto; Implantação de 02 (dois) Núcleos de Acompanhamento e Fiscalização de Penas nos municípios mineiros de Araguari e Vespasiano, com os objetivos de atender a demanda do Poder Judiciário no acompanhamento da execução das penas e medidas alternativas aplicadas nestas comarcas, contribuir para o fortalecimento da política de alternativas penais e redução da população carcerária no Estado de Minas Gerais, assim como atuar na prevenção das violências e criminalidade a partir de intervenção em fatores de risco através de fatores de promoção e proteção social ao público atendido”.

O projeto tem os seguintes órgãos atuando em parceria:

 “A rede parceira do Núcleo de Acompanhamento e Fiscalização de Penas e Medidas Alternativas será composta por instituições que compõem o Sistema de Justiça Criminal e Sistema de Defesa Social em âmbito Estadual e Municipal (Polícia Civil, Polícia Militar, Defensoria Pública, Ministério Público, Tribunal de Justiça), Secretarias Municipais e Estaduais Saúde (CAPS, CAPS-ad, Unidades Básicas de Saúde, Postos de Saúde, Hospitais, etc.), Educação (Escolas Estaduais e Municipais, Creches, UMEIs), Assistência Social (CRAS, CREAS), Trabalho e Renda, Meio Ambiente, Superintendências e Subsecretaria Sobre Drogas, Conselhos Estaduais e Municipais (Conselhos Sobre Drogas, Conselho da Mulher, Conselho do Idoso, Conselho da Criança e Adolescente, etc.), ONG´s, Programas e Projetos de âmbito Federal, Municipal e Estadual”.

Percebemos, ao verificar o texto acima, que nesse aspecto a Polícia Militar do Estado de São Paulo está defasada em relação ao Estado de Minas Gerais, verificamos que há um distanciamento grande entre a Polícia e os órgãos do Poder Judiciário.

VII. CONCLUSÃO

Após estudar o assunto chegamos à conclusão de que é plenamente possível e recomendável que as Polícias Militares, em concurso com os demais órgãos estipulados, realizem a fiscalização indireta das obrigações impostas pelo poder judiciário ao indivíduo beneficiário do sursis penal/ processual.

Como vimos o descumprimento de uma das condicionantes do sursis pode acarretar na revogação do benefício, porém só ocorrerá após análise do juiz da execução penal, desta feita, não haveria a necessidade de conduzir o condenado ao distrito policial apenas para lavratura de boletim de ocorrência, sem que o réu seja levado ao cárcere. Sendo o boletim de ocorrência apenas um ato meramente informativo e que não acarreta na recolha do indivíduo a estabelecimento prisional, não há impeditivo para que ao invés dos Policiais Militares se deslocarem até o Distrito Policial apenas recolhem os dados do réu e por meio de Ofício do comandante de companhia informe o poder judiciário da possível quebra de regra de execução penal.

Nessa busca constante pela melhoria da Segurança Pública devemos otimizar o serviço policial e diminuir o sentimento de impunidade embutido na sociedade. Hoje a pena privativa de liberdade é a exceção em nosso ordenamento jurídico, por isso, se faz necessário à eficiência dos órgãos de fiscalização dos indivíduos beneficiários de medidas que visem o não encarceramento do indivíduo, pois essa falha gera a falsa imagem de impunidade ao resto da população, deixando a pena de cumprir com sua função, tanto preventiva como a repressiva.

A adoção de tal postura geraria a melhora na prestação de serviços de todos os órgãos envolvidos, pois restaria a Polícia Civil mais tempo para que essa cumpra com sua missão constitucional, aumentando seu tempo para investigação, melhorando, por conseguinte a apuração de crimes cometidos em sua área de atuação. Em relação ao Ministério Público, esse ganhará um aliado na fiscalização dos cidadãos cumpridores de medidas alternativas à prisão.

Os juízes verão suas decisões serem cumpridas na prática, e por fim, as Polícias Militares, responsáveis pela manutenção da ordem pública, terão condições de prestar um melhor serviço à comunidade. Em fim, o principal beneficiário é a sociedade, que é o motivo de existência de todos esses órgãos, e do Próprio Estado.

 

Referências
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 17.  Ed. São Paulo. Saraiva, 2012.
BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos Delitos e das Penas.  6ª ed. São Paulo: Martin Claret, 2011.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal /. – 10. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2014.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1, parte geral. 16. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 4, legislação penal especial. 16. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
MARCÃO, Renato. Curso de execução penal. 10. Ed. São Paulo: Saraiva 2012.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 10ª ed. Rio de Janeiro: Impetos, 2008.
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 11ª ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2011.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal Comentado. 9° ed. rev. Dos tribunais, São Paulo, 2009.
ESTEFAM, André. Direito penal, 1 : parte geral. 3. ed. – São Paulo : Saraiva, 2013.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 10ª ed. Rio de Janeiro, Impetos, 2008.
PÊCEGO, Antonio José Franco de Souza. Suspensão condicional do processo em nova dimensão. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 96, 7 out. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4304>. Acesso em: 27Set 2014.
 
Notas
[1] Trabalho orientado pelo 1°TEN Alisson Bordwell da Silva.


Informações Sobre o Autor

Douglas Eduardo de Oliveira

Acadêmico em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública da Academia de Polícia Militar do Barro Branco


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