Violência Obstétrica no Brasil: uma questão de saúde pública

Resumo: Recentemente, a Organização Mundial da Saúde – OMS reconheceu que a violência obstétrica é uma questão de saúde pública, indo ao encontro das pesquisas acadêmicas desenvolvidas nos últimos anos. No presente texto, se contextualizará a violência obstétrica trazendo definições e conceitos de violência obstétrica como uma forma de violência contra a mulher e, após, se discorrerá sobre a relevância do ativismo social, através da internet.[1]

Palavras-chave: Parto. Sofrimento. Violência. Ativismo. Internet.

Resumen: Recientemente, la Organización Mundial de la Salud – OMS reconoció que la violencia obstétrica es una cuestión de salud pública, yendo al encuentro de las investigaciones académicas desarrolladas en los últimos años. En el presente texto, se contextualizará la violencia obstétrica trayendo definiciones y conceptos de violencia obstétrica como una forma de violencia contra la mujer y, después, se discurrirá sobre la relevancia del activismo social, a través de internet.

Palabras clave: Parto. Sufrimiento. Violencia. Activismo. Internet.

Sumário: Introdução. 1. Violência obstétrica: para além da relação sujeito versus objeto. 1.1. Violência obstétrica no mundo: rompendo com o silêncio. 1.2. Violência obstétrica no Brasil: reflexo de uma cultura machista. 2. Violência obstétrica no Brasil e o ciberativismo: quando a internet proporciona a união de mulheres. Considerações finais. Referências.

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, a violência obstétrica ganhou visibilidade em decorrência dos inúmeros estudos acadêmicos, processos propostos no Judiciário, atuações de ativistas que corroboraram para que um novo conjunto de intervenções de saúde pública fosse colocado em prática.

Embora a temática já tenha sido abordada com profundidade e de maneira crítica em outros textos, a sua abordagem ainda é oportuna, relevante e legítima, tendo em vista que recentemente a Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiu uma declaração, intitulada “Prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus-tratos durante o parto em instituições de saúde”, incentivando, inclusive, a criação da Iniciativa Hospital Amigo da Mãe e da Criança (DINIZ et al., 2015, p. 1).

Ações inovadoras como essa, realizada por uma organização internacional, são importantes por ter por intuito visibilizar, prevenir e remediar esta forma de violência nas práticas de saúde, nos âmbitos público e privado e na formação de recursos humanos, bem como para incentivar os governos e as instituições para pesquisas e intervenções (DINIZ et al., 2015, p. 377).

Com o intuito de colaborar com o debate sobre a temática, tece-se o presente texto introduzindo a temática com uma contextualização de violência obstétrica.

1. Violência obstétrica: para além da relação sujeito versus objeto

Desde os tempos bíblicos a dor tem sido associada ao processo de parto, obrigando a parturiente a suporta-la e aceita-la. A passagem bíblica de Gênesis 3, em seu versículo 16, retrata esse contexto, quando Eva prova o fruto do pecado original, induz Adão a também pecar e recebe como punição a dor multiplicada na parturição (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 1-2).

A Sagrada Escritura cita que as dores durante o parto são punições que a mulher deve sentir por ter cometido o pecado original, interferindo em seus sentimentos e percepções a cerca deste momento, substituindo o sentimento de prazer durante a concepção pelo castigo (BEZERRA; CARDOSO, 2006 apud ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 2).

A replicação desse pensamento no arcabouço histórico e cultural da sociedade leiga e de profissionais de saúde expõe a mulher à violência de gênero e, consequente, a obstétrica, ao naturalizar a dor como inerente à experiência da maternidade (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 2).

O parto é um momento único na vida da mulher. Trata-se de um processo fisiológico que requer o cuidado de profissionais da saúde, mas que deve ser de protagonismo da mulher. Distintamente de outros acontecimentos que necessitam de cuidados hospitalares, o processo de parturição é fisiológico, normal necessitando, na maioria das vezes, apenas de apoio, acolhimento, atenção, e o mais importante, humanização (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 2).

Humanizar diz respeito à prestação de uma assistência que tenha como prioridade a qualidade do cuidado garantindo o respeito quando aos direitos do paciente, sua individualidade e cultura (DESLANDES, 2004 apud ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 2). A humanização da assistência ao parto vem ao encontro dos desejos das mulheres de que a vivência do parto aconteça conforme as suas perspectivas (DIAS; DOMINGUES, 2005 apud ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 2).

Se para humanizar o atendimento da mulher em período reprodutivo é necessário reconhecer a sua individualidade, é mister perceber suas necessidades e capacidades de lidar com o processo do nascimento, reconhecendo o viés cultural, histórico e antropológico do processo saúde doença (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 5).

Atualmente,

A mulher e seu corpo têm sido vistos como máquina, onde o engenheiro é o profissional médico que detém todo o saber sobre ela, negligenciando informações, emoções, sentimento, percepções e direitos da mesma no gestar e parir, sendo impedidas de ter a presença de acompanhante, de decidir a posição que querem ter seus bebês e de expressar suas emoções e sentimentos, contrariando a Política Nacional de Humanização e mudando o foco da mulher para o procedimento, deixando-as mais vulneráveis à violência, silenciada pelos profissionais e pela própria parturiente. Porém a amarga vivência e o trauma acompanham a mulher porta a fora da instituição” (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 3).

O simples fato de se ter uma Política Nacional de Humanização do Parto não muda a mentalidade mercantil que alguns profissionais da saúde têm. A formação dos profissionais da saúde, em especial dos médicos, tem papel estruturante no desenho atual da assistência e na resistência à mudança (DINIS; et. al.; 2015, p. 381).

A maioria dos cursos de medicina utilizam como biografia livros desatualizados e a prática médica é, muitas vezes, aprendida de forma descolada do seu balizamento ético e com a priorização de competências em detrimento de valores como o cuidado (DINIS; et. al.; 2015, p. 381).

Para que a relação deixe de ser entre sujeito-objeto (médico versus doença) e passe a ser entre seres humanos, precisa-se desconstruir a hierarquia sexual e a estigmatização criada sobre a mulher, pois quanto maior a vulnerabilidade da mulher, mais rude e humilhante tende a ser o tratamento oferecido a ela.

Esse tipo de violência é reproduzido por meio da hierarquia e dominação do saber médico sobre o corpo da mulher, ferindo diretamente a autonomia a respeito daquilo que somente pertence a elas, os seus corpos (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 5).

Assim, mulheres pobres, negras, adolescentes, sem pré-natal ou sem acompanhante, prostitutas, usuárias de drogas, vivendo em situação de rua ou encarceramento estão mais sujeitas a negligência e omissão de socorro (DINIS; et. al.; 2015, p. 381). A banalização da violência contra as usuárias relaciona-se com estereótipos de gênero presentes na formação dos profissionais de saúde e na organização dos serviços (DINIS; et. al.; 2015, p. 381).

É urgente que os profissionais da saúde tenham uma formação mais humana, voltada para o respeito à autonomia, à individualidade e a privacidade da mulher, assim, talvez se tenha como regra o parto humanizado.

1.1. Violência obstétrica no mundo: rompendo com o silêncio

Embora o termo “violência obstétrica” seja considerado novo, o sofrimento das mulheres durante a assistência ao parto já era relatado em meados do século do passado.

Nos Estados Unidos, em 1950, uma revista de donas de casa intitulada Ladies Home Journal, já rompia o silencia ao narrar relatos de violência no parto ao publicar a matéria “Crueldade nas Maternidades”. Nesse texto, descrevia-se a violência obstétrica como uma forma de tortura dispensada durante o tratamento das parturientes ao serem submetidas ao sono crepuscular através da combinação de morfina e escopolamina, que produzia sedação profunda, não raramente acompanhada de agitação psicomotora e eventuais alucinações (DINIS; et. al.; 2015, p. 377). Ainda, relatava que, os profissionais colocavam algemas e amarras nos pés e mãos das pacientes para que elas não caíssem do leito e com frequência as mulheres no pós-parto tinham hematomas pelo corpo e lesões nos pulsos, bem como lesões decorrentes dos fórcepses (DINIS; et. al.; 2015, p. 377).

Em 1958, no Reino Unido, criou-se a Sociedade para Prevenção da Crueldade contra as Grávidas que na sua carta de fundação, posteriormente publicada no jornal Guardian, também denunciavam violações de direitos das parturientes em hospitais.

O movimento feminista, a partir da década 60, muito colaborou para que os direitos das mulheres fossem respeitados e as violações desses viessem à público.

Em 1998, o Centro Latino Americano dos Direitos das Mulheres publicou um relatório Silencio y Complicidad: Violencia contra la mujer em los servicios públicos de salud no Peru, com extensa documentação das violações dos direitos humanos da mulher, tornando as violações durante o parto algo de conhecimento público.

Assim como em outros países da América Latina, no Brasil o tema era comumente abordado em trabalhos feministas, fora e dentro da academia, como se discorrerá a seguir.

1.2. Violência obstétrica no Brasil: reflexo de uma cultura machista

A violência caracteriza-se como um grave fenômeno social que está em expansão, em todas as suas formas, sendo que são praticadas contra as mulheres ganha caráter endêmico em contextos de desigualdade social, racial, de gênero (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 1).

A violência contra a mulher é definida, pelo Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (1996, p. 6 apud ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 1) como “qualquer ato ou conduta baseada no gênero, causando morte, dano ou sofrimento de ordem física, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada”. Logo, a violência contra a mulher apresenta-se em distintas expressões e uma delas tem sido muito presente e não identificada: a violência obstétrica (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 1).

No Brasil, desde 1980, com a publicação em Espelho de Vênus vários estudos têm relatado vivências negativas de mulheres durante o parto. Nessa publicação, o Grupo Ceres fez uma etnografia da experiência feminina, descrevendo explicitamente o parto institucionalizado como uma vivência violenta (DINIS; et. al.; 2015, p. 378).

A violência obstétrica já era tema também das políticas de saúde ao final da década de 1980: o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM), por exemplo, reconhecia o tratamento impessoal e muitas vezes agressivo da atenção à saúde das mulheres (DINIS; et. al.; 2015, p. 378).

No entanto, o tema por muito tempo foi negligenciado por três grandes motivos: (a) por ter pauta feminista, (b) pela resistência dos profissionais e (c) pela falta de acesso das mulheres pobres a serviços essenciais (DINIS; et. al.; 2015, p. 378).

As denunciaram eram tantas que o Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde e o Departamento de Medicina Preventiva da Universidade de São Paulo (USP), a partir de 1993, promoveram cursos de capacitação para o atendimento a mulheres vítimas de violência (DINIS; et. al.; 2015, p. 378).

Foi em 1993, com a carta de fundação da Rede pela Humanização do Parto e do Nascimento (REHUNA), que o termo violência obstétrica ganhou maior definição e repercussão no Brasil, uma vez que reconheceu circunstâncias da violência e do constrangimento durante a assistência à mulher parturiente. No entanto, tal organização, temendo uma reação hostil dos profissionais da saúde, decidiu deliberadamente não falar abertamente sobre violência.

Entende-se por violência obstétrica qualquer ato exercido por profissionais da saúde no que cerne ao corpo e aos processos reprodutivos das mulheres, exprimindo através de uma atenção desumanizada, abuso de ações intervencionistas, medicalização e a transformação patológica dos processos de parturição fisiológicos (JUARES et al; 2012 apud ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 1).

De acordo com Andrade e Aggio (2014, p. 5 apud BRASIL, 2001),

A medicalização envolta no processo de trabalho de parto e parto vem retirando o protagonismo da mulher, onde o profissional da saúde passa de coadjuvante a ator principal dessa experiência, enfatizando o aspecto patológico e biológico como se a gravidez fosse doença, e reforçando as relações desiguais, o que pode vir a contribuir para o grande número de intervenções desnecessárias, como consequência a violência obstétrica e de gênero”.

A violência obstétrica tem implicações sobre a morbimortalidade materna. Dentre os motivos estão: (a) o manejo agressivo do parto vaginal; (b) o constrangimento ou coerção à cesárea; (c) a negligência em atender mulheres que expressam seu sofrimento ou que pedem ajuda de modo insistente; (d) a hostilidade contra maneiras de assistência que fogem do modelo hegemônico – o uso de doulas, por exemplo; (e) a hostilidade, negligência e retardo em dar atendimento à mulheres que sofreram aborto por acreditar que esse foi provocado; (f) o impedimento à presença de um acompanhante (DINIS; et. al.; 2015, p. 382).

 A violência obstétrica pode-se mostrar de diversas formas no trabalho de parto e parto, desde a não explicação e solicitação de autorização para a realização de procedimentos, até a injúria verbal, exprimida por palavras ofensivas, visando impedir a mulher de demonstrar os seus sentimentos antes e durante o parto (ANDRADE; AGGIO, 2014, p. 6).

2. Violência obstétrica no Brasil e o ciberativismo: quando a internet proporcionar a união de mulheres

A violência obstétrica é expressa principalmente pela negligência na assistência, discriminação social, violência verbal, física e psicológica. Também se considera ato de violência obstétrica, conforme Andrade (et. al., 2016, p. 30), o uso inadequado de tecnologias e a adoção de procedimentos durante o ciclo gravídico-puerperal sem o consentimento explícito e informado da gestante/parturiente, ferindo os princípios dos direitos individuais da mulher.

Pesquisas em diversos estados brasileiros evidenciaram o uso arbitrário de autoridade pelos profissionais de saúde em relação ao corpo e à sexualidade das mulheres durante e após o parto, de modo que dados apontam que, no Brasil, uma entre quatro mulheres sofre violência durante o parto, tendo-se como reclamações mais comuns as condutas desrespeitosas e grosseiras (ANDRADE; et. al., 2016, p. 30).

Ressalta-se que a relação entre profissionais de saúde e pacientes de camadas socioeconômicas desfavorecidas é marcada pela desconfiança, pelo desrespeito, por conflitos mal resolvidos que geralmente acabam expressos em maus tratos às puérperas.

Embora a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomende que o parto tenha início de forma espontânea (não induzida, portanto), garantindo-se a liberdade da parturiente para mover-se a qualquer momento e o direito de receber acompanhamento contínuo durante o processo de parto, não é incomum que tais direitos sejam desrespeitados.

A OMS ainda orienta que todo cuidado deve ser individualizado e não deve ocorrer separação de mãe e bebê imediatamente após o parto (ANDRADE; et. al., 2016, p. 30). É saudável para o bebê e para a mãe que, após o processo de parto, fiquem alguns instantes em proximidade.

No entanto, as boas práticas não são, em regra, aderidas no Brasil. O atual modelo de atendimento ao parto é marcado pela medicalização da assistência e pelas intervenções obstétricas desnecessárias. De acordo com Andrade (et. al., 2016, p. 30),

A persistente utilização de práticas não recomendadas pelas evidências científicas, como o uso abusivo de ocitocina, imobilização no leito e posição litotômica no parto, pode levar à compressão de grandes vasos e prolongamento do trabalho de parto (TP) e do período expulsivo e, consequentemente, repercutir sobre os resultados perinatais”.

Nesse contexto de violação e de danos originados no cuidado obstétrico profissional, insurge o ciberativismo de mulheres mães como uma estratégia e proposta de mobilização social contemporânea. Trata-se de uma utilização do ciberespaço como um local para reivindicação de direitos reprodutivos e de enfrentamento à violência obstétrica.

Tal mobilização está atrelada ao surgimento e à atuação da Rede pela Humanização do Parto e do Nascimento (REHUNA), que desde a sua fundação possui um papel de destaque por denunciar circunstâncias violentas da assistência ao parto, caracterizando-as como pouco humanas, constrangedoras e marcadas pela ocorrência de intervenções desnecessárias e violentas, por transformar a experiência de parir e nascer em algo ruim e traumatizante.

Ainda, na sua carta de fundação, o REHUNA requereu respeito e qualidade de assistência ao parto no Brasil.

O REHUNA é integrado por enfermeiros e médicos da área obstétrica e da saúde pública, o que constitui um aspecto positivo, por demonstrar e reunir profissionais da saúde que são críticos, mas também um aspecto negativo, por restringir o debate da violência obstétrica aos profissionais da saúde.

O fato de serem os profissionais da saúde os principais envolvidos neste debate fizeram com que apenas uma pequena parcela da informação a respeito das violentas condições de assistência ao parto chegasse, de fato, às mulheres usuárias dos sistemas de saúde, as quais representam o principal grupo de interessadas, uma vez que são ou poderiam/deveriam ser protagonistas do evento do nascimento” (SENA; TESSER, 2017, p. 210).

As possíveis vítimas da violência obstétrica não tiveram acesso a informações que vão ao encontro de boas práticas de parturização, mais humanas e menos intervencionistas. No entanto, com a chegada da internet e a popularização do computador, a atuação do REHUNA se fortaleceu, proporcionando assim uma integração entre a Rede e as mulheres mães (que foram usuárias do sistema de saúde).

O acesso das mulheres ao meio digital tem sido uma ferramenta importante para o empoderamento feminino, questão central para a promoção da saúde. E esse empoderamento está relacionado ao aumento das possibilidades que os indivíduos e as comunidades têm de exercer controle sobre sua própria saúde. E o acesso à informação sobre os diferentes elementos que interferem em sua saúde é estratégia fundamental para que os indivíduos adquiram maior controle e poder de decisão sobre tais fatores (SENA; TESSER, 2017, p. 213).

Como exemplo desse potencial cita-se duas iniciativas brasileiras ocorridas entre 2012 e 203 que foram idealizadas e desenvolvidas totalmente em ambiente de conectividade, utilizando as novas mídias como ferramentas para ação e promoção da saúde, especialmente a saúde da mulher, tendo como foco a violência obstétrica, que são: o teste da violência obstétrica e o documentário “violência obstétrica – a voz das brasileiras”.

Tais ações contribuíram para mobilizações, debates e reflexões necessárias para que a violência obstétrica não fique restrita ao campo médico e acadêmico. A internet e a utilização de mídias alternativas tornaram-se uma ferramenta de democratização da produção e do acesso à informação sobre a saúde da mulher.

Tratam-se de exemplos de verdadeira rebeldia e fuga da lógica mercantil e hierárquica que coloca o saber médico acima dos desejos e dos interesses do paciente, consolidando-se uma boa maneira de combater a violência obstétrica através do conhecimento das parturientes sobre os seus corpos, a sua vida e a sua saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No Brasil, ao longo dos anos de discussão sobre a Política Nacional de Humanização ao Pré-Natal, Parto e Puerpério, o processo de institucionalização do parto continuou a interferir na medicalização do parto e no aumento dos índices de realização de cesariana, o que reforça a medicalização do corpo feminino ao negar que essa seja protagonista da sua própria história e sujeito pleno de direito.

A superação da violência obstétrica é um desafio que pode ser concretizado através do seu reconhecimento como uma violação de direitos humanos (e, portanto, de direito das mulheres).

Acredita-se que a inclusão de direitos das mulheres e dos direitos sexuais e reprodutivos como disciplina de graduação em cursos da área da saúde colaborariam para que os profissionais desse ramo tivessem uma formação mais humanística e ética.

O investimento na formação de obstetrizes e enfermeiras obstetras seria oportuno e eficiente em aumentar o número de partos fisiológicos e na implementação de um tratamento mais horizontalizado por desmistificar o dualismo sujeito-objeto, médico-doença.

O simples fato de o acesso à informação ser mais fácil não desobriga o profissional de saúde a “esquecer” de fornecer informações sobre assistência ao parto para as usuárias durante o pré-natal, o parto e o pós-parto. Ainda, deve esse garantir o direito à parturiente de ser acompanhada durante todo o processo, seja por um familiar ou por uma profissional com conhecimento diferente do modelo hegemônico de assistência.

 

Referências
ANDRADE, Briena Padilha; AGGIO, Cristiane de Melo. Violência obstétrica: a dor que cala. Anais do III Simpósio Gênero e Políticas Públicas [online]. pp. 1-7, 2014.
ANDRADE, Priscyla de Oliveira Nascimento; DA SILVA, Jéssica Queiroz Pereira; DINIZ, Cinthia Martins Menino; CAMINHA, Maria de Fátima Costa. Fatores associados à violência obstétrica na assistência ao parto vaginal em uma maternidade de alta complexidade em Recife, Pernambuco. Revista Brasileira de Saúde Materna e Infantil [online]. Edição 1. Recife. n. 16, pp. 29-37, 2016.
DINIZ, Simone Grilo; SALGADO, Heloisa de Oliveira; ANDREZZO, Halana Faria de Aguiar; DE CARVALHO; CARVALHO, Priscila Cavalcanti Albuquerque; AGUIAR, Cláudia de Azevedo; NIY, Denise Yoshie. “Violência obstétrica como questão para a saúde pública no Brasil: origens, definições, tipologia, impactos sobre a saúde materna, e propostas para sua prevenção”. Journal of Human Growth and Development [online]. Edição 3. São Paulo: Periódicos eletrônicos em psicologia. n. 25, pp. 377-384, 2015. 
SENA, Ligia Moreiras; TESSER, Charles Dalcanale. Violência obstétrica no Brasil e o ciberativismo de mulheres mães: relato de duas experiências. Revista interface: comunicação, saúde e educação. Edição 60. n. 21, pp. 209-220, 2017.
 
Nota
[1] Artigo orientado pela Profa. Dra. Maria Cláudia Crespo Brauner


Informações Sobre o Autor

Liziane Bainy Velasco

Advogada. Mestranda em Direito e Justiça Social pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG


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