Tratamento diferenciado na punibilidade entre crime previdenciário e crime tributário

Resumo: O objetivo deste trabalho é demonstrar o tratamento diferenciado entre crimes previdenciário e tributário, iniciando-se sua distinção pela legislação em que são tipificados; este na Lei 8.137/90 e aquele no Código Penal. Outrossim, propor uma reflexão sobre as contribuições definidas como espécie de tributo, cuja
punibilidade possui rigor desigual quanto aos demais tributos. O tema proposto possui relevância nacional, uma vez que os tributos, incluindo-se as contribuições previdenciárias, são compulsórios e sua omissão, por qualquer cidadão, pode enquadrar-se como crime.

Palavras-chave: Tributo. Contribuições. Espécie. Crime. Punibilidade.

Abstract: The objective os this work is to demonstrate the difference between the treatment of social security an tax crimes, beggining the differentiation by the legislation in which are typified this in Law 8.137 / 90 and that in the Penal Code. In addition, this work aims to propose a reflection on the contribuitions defined as a kind of tribute, whose punishment has unequal severity over other taxes. The proposed theme is nationally relevant since taxes, including contribuitions, are compulsory, and their omission, by any citizen, may framed as a crime.

Keywords: Tribute. Contribuitions. Species. Crime. Punishability.

Sumário: Introdução; 1 Tributos: Definição e espécies; 2 Crimes Contra a Ordem Tributária – ART. 1º e 2º da Lei nº 8.137/1990; 3 Crimes Previdenciários – Art. 168-A e 337-A do Decreto –Lei nº 2848/1940 (Código Penal); 4 PUNIBILIDADE: Diferença entre as sanções nos crimes previdenciários em relação aos crimes contra a ordem tributária; Conclusão.

INTRODUÇÃO

Inicialmente, mister salientar que a escolha pelo tema deu-se em virtude da relevância em âmbito nacional. O país encontra-se em discussão sobre a necessidade da Reforma da Previdência Social, cuja justificativa é o déficit em suas contas. Embora não haja comprovação de que a Previdência é deficitária, a omissão de repasse das contribuições é recorrente.

Os Crimes contra a Previdência eram dispostos na Lei de Custeio[1], especificamente em seu art. 95. As condutas ilícitas constantes no artigo 95 da referida Lei não dispunham de cominação legal, exceto nas alíneas d, e e f, nas quais faziam remissão ao art. 5º da Lei 7.492/86.

No intuito de   efetivamente coibir os crimes previdenciários, promulga-se a Lei 9.983/2000, revogando-se todo o art. 95, salvo seu §2º, e inserindo os artigos 168-A (Apropriação Indébita Previdenciária), 313-A (Inserção de Dados Falsos em Sistemas de Informações), 313-B (Modificação ou Alteração não Autorizada de Sistema de Informações) e 337-A (Sonegação de Contribuição Previdenciária) no Código Penal. O Legislador deixou claro tratarem os arts. 168-A e 337-A, especificamente, da Previdência Social.

Com efeito, os Crimes Contra a Ordem Tributária não receberam a mesma atenção, uma vez que não encontram-se tipificados no Código Penal e sim na Lei 8.137/90, com penas diferentes.

Visando uma melhor compreensão do tema, inicia-se uma explanação geral das espécies de tributo, para após, elucidar as diferenças entre os crimes previdenciário e tributário.

A pesquisa objetivou apontar o tratamento diferenciado em nossa legislação quanto aos tributos e as contribuições sociais, em especial criminalmente.

As referências para elaboração do trabalho englobam livros, súmulas e Leis, realizando-se uma análise diversificada quanto ao tema.

Intenciona-se, ao fim, apresentar motivações plausíveis para a punibilidade com rigor dispare entre os crimes contra a previdência e contra a ordem tributária.

1 Tributos: Definição e espécies

A definição de Tributos encontra-se no art. 3º, da Lei 5.172 de 25 de outubro de 1966, conforme transcrição infra:

“Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (BRASIL,1.996).

Conforme se vislumbra, o tributo origina-se de disposições legais (fato gerador), cuja obrigatoriedade de pagamento não se constitui como punição por algum alto ilícito praticado. O simples enquadramento em dispositivo legal de incidência tributária, conhecido como fato gerador, implica no pagamento de determinado tributo.

Ressalta-se que o Tributo não significa punição por prática de ato ilícito, todavia a prática de ato ilícito gera-se tributação. Tal entendimento encontra-se no julgamento do Habeas Corpus 77.530-4/RS, pelo STF, motivado pelo Princípio da Isonomia Fiscal c/c princípio pecunia non olet (dinheiro não tem cheiro).

Inicialmente, entende-se, pura e simplesmente, que a finalidade do tributo é de arrecadação. O Autor Cláudio Borba, em sua obra Direito Tributário, esclarece:

“No estágio atual das finanças públicas, dificilmente um tributo é utilizado apenas como instrumento de arrecadação. Pode ser a arrecadação o seu principal objetivo, mas não o único. O tributo também é largamente utilizado com o objetivo de interferir na economia privada, estimulando atividades, setores econômicos ou regiões, desestimulando o consumo de certos bens produzindo, finalmente, os mais diversos efeitos da economia” (BORBA, 2009, p.56).

O termo tributo indica gênero, cuja definição quantitativa das espécies é divergente entre os doutrinadores. Algumas linhas doutrinárias adotam a teoria Tripartite, sendo apenas 3 as espécies de tributos, quais sejam: Impostos, Taxas e Contribuições de Melhorias.

A teoria adotada pelo STF é a pentapartite, cujos tributos são: 1) Imposto (art. 145 da CF/88); 2) Taxa (art. 145 da CF/88); 3) Contribuição de Melhoria (art. 145 da CF/88); 4) Contribuições (art. 149 da CF/88) e 5) Empréstimo Compulsório (art. 148 da CF/88).

O imposto é definido no art. 16 do CTN como: “tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte” (BRASIL, 1.966). Não há uma contraprestação ou atividade específica realizada pelo Estado para sua cobrança. São alguns exemplos: II (Imposto sobre Importação), IE (Imposto sobre Exportação) e IPTU (Imposto sobe a Propriedade Predial e Territorial Urbana).

A Taxa encontra-se explicitada no art. 145, II da CF/88, no qual autoriza-se sua criação pelos Entes Federados como contraprestação do exercício do poder de polícia, bem como pelo aproveitamento de serviços públicos pontuais e divisíveis ou disponíveis ao contribuinte. Exemplifica-se a cobrança deste tributo como a Taxa de Inspeção Sanitária e Taxa de Alvará.

Contribuição de Melhoria é aplicada em virtude de realização de obras públicas, na qual ocorra valorização imobiliária. O art. 81 do CTN limita a cobrança ao total da despesa realizada e, individualmente, ao montante acrescido ao imóvel pela valorização, oriunda da obra pública.

Contribuições é também denominada pela doutrina como Contribuições Especiais ou Contribuições Parafiscais. Mister apresentar a conceituação fornecida pelo Professor Eduardo Sabbag, em sua obra: Manual de Direito Tributário:

“As contribuições são tributos destinados ao financiamento de gastos específicos, sobrevindo no contexto de intervenção do Estado no campo social e econômico, sempre no cumprimento dos ditames da política de governo” (SABBAG, 2016, p.985).

As contribuições são divididas em: 1) Contribuições Sociais; 2) Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico; 3) Contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas e 4) Contribuições para Custeio do Serviço de Iluminação Pública. Essas divisões foram elencadas no art. 149 e 149-A da CF, abaixo:

Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo […]” (BRASIL,1988).

“Art. 149-A Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III […]” (BRASIL, 1988).

Empréstimos Compulsórios é um tributo com fim específico. Sua criação é autorizada pela CF/88, no art. 148, incisos I e II para custeio de despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, guerra externa ou sua iminência, bem como para investimento público emergencial e com relevante interesse nacional, observando-se o mesmo exercício financeiro em que a lei instituidora foi publicada.

2 Crimes Contra a Ordem Tributária – ART. 1º e 2º da Lei nº 8.137/1990

Os Crimes Contra a Ordem Tributária encontram-se em Lei esparsa, especificamente nos artigos 1º e 2º da Lei 8.137/90, conforme transcrição infra:

“Dos crimes praticados por particulares

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:       

I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II – fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III – falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

IV – elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V – negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Pena – reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V”(BRASIL, 1990).

“Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:      

I – fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo;

II – deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;

III – exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal;

IV – deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento;

V – utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa” (BRASIL, 1990).

Vislumbra-se que o legislador dividiu em dois artigos, com punibilidades diferentes, os crimes contra a ordem tributária.

No art. 1º estão elencados os denominados crimes materiais, no qual o resultado é fundamental para a consumação do ilícito. Ressalta-se que somente constitui-se crime quando ocorrer o lançamento definitivo do tributo, conforme disposto na Súmula Vinculante nº 24 do STF: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”.

O art. 2º tem elencados os crimes formais, cuja consumação configura-se com a prática da conduta, independentemente do resultado.

O professor Leandro Paulsen, em sua obra Curso de Direito Tributário Completo, define o patrimônio jurídico protegido ao se criminalizar alguns atos referentes aos tributos:

“A lei penal tipifica determinadas condutas visando à proteção de bens jurídicos. No caso dos crimes contra a ordem tributária, os principais bens protegidos são a integridade do erário, a arrecadação e o cumprimento das leis tributárias. (PAULSEN, 2017, p.521) ”.

Verifica-se que a proteção ao erário, arrecadação e cumprimento da legislação tributária possuem a finalidade de assegurar que o Estado possua receita para pagamento de suas despesas.

3 Crimes Previdenciários – Art. 168-A e 337-A do Decreto –Lei nº 2848/1940 (Código Penal)

Os Crimes Previdenciários, diferentemente dos Crimes Contra a Ordem Tributária, estão dispostos no Código Penal, nos quais foram inseridos através da Lei 9.983/2000. O art. 160 – A elenca a tipificação da Apropriação Indébita Previdenciária:

“Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional: 

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. 

§ 1o Nas mesmas penas incorre quem deixar de: 

I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público; 

II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;

III – pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social” (BRASIL, 1940).

Observa-se que o bem jurídico a ser protegido é o patrimônio da Previdência Social, especificamente inibir os desvios das contribuições previdenciárias descontadas e não repassadas, que auxiliam no custeio dos benefícios.

Trata-se de crime omissivo, necessitando da inércia do agente para sua caracterização, cuja ação penal é pública incondicionada.

Ressalta-se a controvérsia quanto à necessidade do dolo específico ou genérico para a configuração do crime. O STF entende pela desnecessidade de dolo específico para a tipificação, conforme julgamento do HC 96.092:

“É firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal no sentido de que para a configuração do delito de apropriação indébita previdenciária, não é necessário um fim específico, ou seja, o animus rem sibi habendi… A espécie de dolo não tem influência na classificação dos crimes segundo o resultado, pois crimes materiais ou formais podem ter como móvel tanto o dolo genérico quanto o dolo específico” HC 96.092, de 02.06.2009”.

Doutrinariamente discute-se quanto à natureza formal ou material da apropriação indébita previdenciária. O crime omissivo material, necessariamente, precisa ocorrer um resultado naturalístico para sua consumação, diferente do formal, cujo resultado pode ou não ocorrer. Importante explanar o entendimento da professora Marisa Ferreira dos Santos, em sua obra, Direito Previdenciário Esquematizado:

“Formal: ainda que pese a existência de controvérsias acerca da natureza formal ou material do delito, pensamos que se trata de crime formal, pois que não é necessária a produção de resultado naturalístico, mas tão somente de resultado jurídico. Ademais, não vislumbramos a possibilidade de tentativa, característica dos crimes materiais” (SANTOS, 2016, p.664).

Todavia, o Supremo Tribunal Federal possui entendimento contrário quanto à classificação anteriormente citada:

“APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA — CRIME — ESPÉCIE. A apropriação indébita disciplinada no artigo 168- A do Código Penal consubstancia crime omissivo material e não simplesmente formal. INQUÉRITO – SONEGAÇÃO FISCAL – PROCESSO ADMINISTRATIVO. Estando em curso processo administrativo mediante o qual questionada a exigibilidade do tributo, ficam afastadas a persecução criminal e – ante o princípio da não-contradição, o princípio da razão suficiente – a manutenção de inquérito, ainda que sobrestado”. (…)” (Inquérito 2.537 AgR/GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe-107, 13.06.2008).

Com efeito, entende a Suprema Corte que a constituição definitiva do crédito tributário é condicionante para início da persecução penal.

O crime de Sonegação Previdenciária, também inserido pela Lei 9.983/2000 em nosso Código Penal, art. 337-A, ocorre quando o agente:

“Art. 337-A. Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: 

I – omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações previsto pela legislação previdenciária segurados empregado, empresário, trabalhador avulso ou trabalhador autônomo ou a este equiparado que lhe prestem serviços;

II – deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa as quantias descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador ou pelo tomador de serviços;

III – omitir, total ou parcialmente, receitas ou lucros auferidos, remunerações pagas ou creditadas e demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa” (BRASIL, 1940).

Assemelha-se ao Crime de Apropriação Indébita, haja vista o bem tutelado ser o patrimônio da Previdência Social, sendo a prática dependente da omissão do agente discorrido entre os incisos I a III e a ação penal é pública incondicionada.

Trata-se de crime omissivo material, entendimento exarado pelo STJ no julgamento do HC 102596 SP, da 5ª Turma, Relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho.

4 PUNIBILIDADE: Diferença entre as sanções nos crimes previdenciários em relação aos crimes de ordem tributária

Cediço que as Contribuições Previdenciárias são espécies de tributo. Todavia, o legislador trouxe um tratamento diferenciado para os Crimes pertinentes à Previdência Social.

Perceptível a referida diferenciação quando comparamos o crime de apropriação indébita previdenciária, art. 168-A do CP, com o crime contra a ordem tributário do art. 2º, II, da Lei 8.137/90.

A Apropriação Indébita Previdenciária (art. 168-A do CP), cuja conduta é “Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional” (Brasil, 1.940) é punível com reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

Semelhante tipificação encontra-se no art. 2º, inciso II da Lei 8.137/90, no qual dispõe “Deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos” (BRASIL, 1.990) a pena é de detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa.

Ressalta-se que a reclusão é medida de restrição de liberdade que pode ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A detenção, por sua vez, é condenação mais leve, no qual inicia-se em regime semi-aberto ou aberto.

Com efeito, o crime de sonegação tributária, disposto no art. 1º caput, novamente explicita a distinção, pelo legislador, de tributo e contribuições ao mencionar: “Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório […]” (BRASIL, 1.990).

A professora Marisa Ferreira dos Santos, em sua obra, Direito Previdenciário Esquematizado traz a baila fundamento plausível para a distinção apresentada:

“A Previdência Social, historicamente, tem sido alvo de sucessivas crises financeiras, ocasionadas por atos delituosos internos e externos. Com isso, passou a receber proteção especial inclusive pela legislação penal, com a previsão de condutas criminosas específicas” (SANTOS, 2016, p. 656).

Vislumbra-se que a proteção à Previdência Social não refere-se ao seu patrimônio, mas as necessidades básicas que esta promove ao contribuinte. Relevante expor o posicionamento dos Autores Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, na obra Manual de Direito Previdenciário, quanto a finalidade de punição aos crimes previdenciários:

“Essa norma tem objetivo claro, qual seja, evitar a sonegação fiscal, inibindo o desvio de contribuições destinadas ao financiamento da Seguridade Social. Tutela a subsistência financeira das ações destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social” (CASTRO; LAZZARI, 2016, p. 347).

Destarte, a Previdência como integrante da Seguridade Social possui um caráter essencial, haja vista que os benefícios funcionam como equalizadores sociais para os que se encontram em situação desfavorável.

CONCLUSÃO

Evidenciado que as contribuições previdenciárias possuem tratamento distinto em relação ás demais espécies de tributos.

Salienta-se que, tecnicamente, não deveria o legislador utilizar-se de regramentos dispares, uma vez que as contribuições são tipo de tributo.

Percebem-se tais diferenciações quando se inseriu os artigos 168-A (apropriação indébita previdenciária) e 337-A (sonegação previdenciária) em nosso Código Penal, cuja Lei 8.137/90 dispunha sobre crimes contra a ordem tributária, no qual abarcam a sonegação e apropriação indébita no âmbito dos tributos em geral.

Outrossim, o legislador segrega as contribuições como espécie de tributo quando no art. 1º da Lei 8.137/90 define como ilícito” suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social”[…].

Com efeito, alguns doutrinadores justificam o rigor mais elevado nos crimes contra a previdência, bem como esse destaque das contribuições em relação aos demais tributos, em virtude do bem jurídico protegido. No caso das contribuições previdenciárias, o bem protegido transcende o mero patrimônio da Seguridade Social e alcança bens mais valorosos como a saúde, a dignidade da pessoa humana, honra, dentre outros. Os recursos destinados à Seguridade Social abrangem a Saúde, Previdência e Assistência Social.

Todavia, os demais tributos também possuem grande relevância, haja vista serem instrumento de arrecadação e de regulação da economia. Por tanto, são fontes de receita para manutenção do Estado e a promoção de suas atividades, bem como equalizadores econômicos.

Cediço que caso o Estado não consiga manter-se, ou seja, não obtenha receita para suas despesas, não há que se falar em fomento para a efetiva garantia dos direitos sociais.

Infere-se que a justificativa do enrijecimento punitivo dos crimes contra a previdência, em virtude dos bens jurídicos protegidos, é frágil.

Não se demonstra razoável tratar uma espécie de tributo com maior rigor em detrimento dos demais, visto que todos possuem finalidades importantes.

Destarte, constata-se atecnia legislativa separar as contribuições previdenciárias dos demais tributos, devendo a punibilidade dos crimes contra a ordem tributária ser exatamente a mesma imputada aos crimes contra a previdência social, haja vista tratarem de ilícitos contra o gênero tributo.

 

Referências
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Nota
[1] Lei 8.212 de 24 de julho de 1991 é denominada Lei de Custeio.

 


 

Informações Sobre os Autores

 

Tatiana Alvarenga Jardim

 

Advogada e Pós – Graduanda em Direito da Seguridade Social pela Universidade Cândido Mendes – UCAM e membro do Núcleo de Pesquisa e Escrita Científica da Faculdade Legale

 

Carlos Alberto Vieira de Gouveia

 

Carlos Alberto Vieira de Gouveia é Mestre em Ciências Ambientais e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Vice-Presidente para a área Previdenciária da Comissão Direitos e Prerrogativas e Presidente da Comissão de Direito Previdenciário ambas da OAB-SP Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da Faculdade Legale

 


 

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